Diário de um mundo novo – dia 134
— Sonho de consumo?
— Consumir.
*
— Putaquepariu, cara! Essa estradinha tem um milhão de buracos.
— Eu sei, passo por aqui todos os dias.
— E precisa acertar todos?
*
— Do quê que cê gosta?
— De ganhar dinheiro.
— Nossa, nunca pensei que você gostasse de trabalhar.
— E quem falou em trabalhar?
*
— É, o inverno chegou. Bora tomar uma pra esquentar.
— Bora. ...Peraí! A gente não passou o verão inteiro tomando umas pra refrescar?
— Cê quer tomar uma ou quer arrumar treta?
— Bora tomar uma, vai.
Diário de um mundo novo – dia 135
Filhos.
Filhas, no nosso caso.
Pessoas crescem e devem viver a própria vida. Cada uma trilhando o próprio caminho.
É assim que tem que ser.
Mas quem disse que não dói?
Dói a distância, a ausência, as alegrias e tristezas não divididas, experiências não vividas de perto.
“Será que educamos bem? Ensinamos tudo o que precisavam quando precisavam? Será que acertamos mais que erramos?”
E elas seguem aprendendo, errando e acertando. E seguem. Só podemos torcer.
De longe.
É assim que tem que ser.
Mas dói.
Diário de um mundo novo – dia 136
“Brasileiro acha que tudo vai cair do céu. Tá sempre esperando que uma mudança vai melhorar a vida.”
Essa frase é de um amigo italiano que conhece o Brasil e nós, brasileiros. Sabe aquela frase comum “Vai melhorar, cê vai ver”, ou “Deus vai ajudar e nós vamos sair dessa”? Pois é, ele implica com isso. Em parte – e só em parte – ele tem razão. É inútil ficar esperando sem fazer nada. Só a ação produz mudança. Por outro lado, ter esperança é positivo. Muito positivo. Ter esperança é o que, muitas vezes, nos empurra a agir. É ter otimismo e acreditar na perseverança. Ter esperança é bom. E é melhor que não ter.
Nesses tempos difíceis por motivos diferentes, desesperar é a pior atitude. Tá de baixo astral, à beira de uma crise? Imagine-se uma guerreira, um guerreiro, levante a cabeça, escolha uma música alegre que te jogue pra cima, cante e dance com os braços acima dos ombros. Olhe as pessoas nos olhos com doçura, mas firmemente. Sorria. Pro mundo e pra você.
E se o meu amigo aparecer por aí querendo quebrar a sua luta, dê um soco no olho dele.
Diário de um mundo novo – dia 137
Hoje é quinta-feira, primeiro de outubro de 2020.
Teve frio.
Teve sol e calor também.
O dia foi legal e tal.
Passeei com o Shiva, trabalhei, comi correndo legumes cozidos e peito de frango, passeei com Shiva, voltei pro trabalho, fiz contato com cliente novo, disse não a cliente velho – faço milagres, só não sei construir universos – ajudei quem precisava, agradeci sem precisar, fiz mercado, levei Shiva pra passear outra vez, fiz planos pro final do dia e não rolou.
Tô na dúvida se vou dormir ou assistir ao jogo do Milan.
Diário de um mundo novo – dia 138
Dia 2 de outubro, dia de comemoração. De telefonemas, mensagens e lembranças. Flores, muitas flores.
Diário de um mundo novo – dia 139
O uso de máscara voltou à moda. Nos últimos dias a mudança de hábito foi impressionante, positivamente falando. Poucas pessoas caminham pela rua sem ela ou como acessório de queixo, pulso ou cotovelo. É o reflexo do aumento de casos, ninguém quer outra quarentena. Acabo de ler que o presidente do clube de futebol Napoli cancelou a viagem do time para o jogo de amanhã contra a Juventus, depois que um jogador testou positivo. O time entrou em quarentena.
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Chamada de urgência para um serviço. Serviço executado, cliente satisfeito e gerente do banco que vai ficar mais satisfeito ainda. Para mim sobrou o susto: a esposa do cliente não é a esposa do cliente. É cliente de anos, tinha certeza de que eram casados. Ela é quem sempre foi a pessoa ao lado dele, quem cuida da administração desde que era um pequeno comerciante em um container como escritório. Agora que cresceu, ela continua lá, como sempre esteve, comandando a equipe toda. Anos e anos acreditando que eram casados quando de repente ele a chama: “Mãe.”
Diário de um mundo novo – dia 140
Tenho implicância com matéria de jornal que inclua a palavra “entenda”. “Entenda o que significa a mudança da cor da melancia...” “Comprou duas turbinas para a bicicleta. Entenda o motivo” “O coelho fugiu, entenda como aconteceu”. Somos um bando de imbecis?
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Como o tempo demora antes de chegar aos dezoito. E como passa rápido demais depois dos quarenta. A vida acontece entre os vinte e os trinta e nove.
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Acaba de nascer um outro mistério. Todas as manhãs faço café. Todas as manhãs tomo café bem quente, assim que acabo de fazer. Nos últimos tempos tenho percebido que o café não fica tão quente quanto eu gosto. O fogo já não esquenta ou é a água que ferve antes?
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Lasanha.
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E Aperol spritz.
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