Sunday, July 26, 2015

Receita de Tiramisù



Todas as tardes de sábado ele caminhava até o café da praça e fazia a pausa mais longa da semana. Passava horas lendo e bebericando vinho branco, sempre na mesma mesa ao ar livre, com vista para as estátuas da Piazza Cavalli, em Piacenza. No final, pedia um café e um pouco de tiramisù. Era nesse momento que algum conhecido podia se aproximar e trocar uma prosa.

Você vai precisar de:
6 ovos
150 g de açúcar de confeiteiro (glaçucar) com baunilha – açúcar vanille
250 g de mascarpone
Biscoitos savoiardi
Café pronto
1 copo pequeno de vinho Marsala
Cacau em pó
1 pitada de sal



Trabalhava em algum banco, se sabia. Era sempre em trajes formais muito bem passados. Só os sapatos pareciam sofrer com aquele corpo alto e sedentário. Era casado, se presumia, sempre com a aliança enorme, como enorme eram as suas mãos. Transmitia a nítida impressão de só se sentir à vontade no escritório que deveria ocupar. Uma pasta de trabalho era a companheira fiel do todos os dias. Absolutamente todos.

Bata as gemas com o açúcar até formar um creme denso e quase branco (se for difícil achar o açúcar vanille, compre um pacote de glaçucar, duas ou três vagens de baunilha e coloque em um vidro com tampa. Depois de quinze dias, basta peneirar). Adicione o mascarpone e o copinho (uns 50 ml) de Marsala e bata até que o creme fique homogêneo e aveludado.



Durante a semana caminhava passos apressados; devia morar ali pelo centro. Ia e voltava a pé para o trabalho. Parava rapidamente no bar da praça para o café depois do almoço; trocava duas ou três palavras gentis com as senhoras do bar e partia veloz. No final da tarde, chegava no bar como se tivesse hora marcada e medo de se atrasar. Tomava um cálice de vinho branco em pé, no balcão e desaparecia pelas ruas do centro com sua pasta na mão.

Prepare o café e ponha em uma bacia funda. Bata as claras com uma pitada de sal, formando uma neve consistente. Junte as claras em neve com o creme batido anteriormente e misture bem – sem bater.

O café nas manhãs de domingo também era tomado no balcão, em pé. E sumia até segunda-feira. Vez ou outra era visto em algum ponto de ônibus, sóbrio e compenetrado. Um sorriso raro mas afável, óculos e cordialidade. A sua voz pouco se ouvia, um ar distante e destacado ajudavam a manter distâncias.

Em uma forma ou pirex, cubra o fundo com uma camada do creme. Passe rapidamente cada biscoito no café e coloque lado a lado na forma (atenção: os savoiardi se desmancham facilmente quando molhados, devem ser colocados imediatamente na forma, um por um). Despeje metade do creme batido, faça outra camada de biscoitos molhados no café e cubra tudo com a outra metade do creme. 



“Cadê o Senhor do Banco?”, pareciam se perguntar os frequentadores do bar e do centro da cidade. Ninguém sabia o que teria acontecido, ou porquê sumira há dias. A primeira vez em... Quantos anos? Ninguém conhecia sequer o nome dele, reservado que era. O “Senhor do Banco”. Ilações e conjecturas não foram formuladas, que um senhor assim respeitável não suscitava suspeitas. Quando reapareceu tinha a pele ligeiramente bronzeada. Ligeiramente. As estátuas da Piazza Cavalli foram as únicas a restarem impassíveis. A rotina voltava ao normal e a cidade pareceu suspirar aliviada.

Cubra a torta com uma mais que generosa camada de cacau peneirado e leve à geladeira por seis horas. O ideal é fazer à noite para o dia seguinte.



Curiosidades: O Tiramisù ("levanta-me o moral", em tradução livre - quem nunca tomou gemada?) é um doce recente, presumivelmente do fim dos anos sessenta. A sua origem também não é certa, sendo reivindicada por mais de uma região italiana (Lombardia, Vêneto, Toscana...). Assim sendo, não existe uma receita “original”, mas todas se parecem. O Marsala é um vinho licoroso da Sicília, mais precisamente da zona de Trapani (Marsala é uma cidade da província de Trapani). O Mascarpone é um queijo da região Lombardia, com origem em algum ponto entre Milão e Pavia, onde existia a “cascina Mascherpo” [“cascina” é o aglomerado rural que compreende a casa, estábulo, paiol e queijaria; Mascherpo é um sobrenome comum naquela zona].



9 comments:

BLOGZOOM said...



Allan,

Fiquei entretida e curiosa com a historia que foi entrelaçando o preparo do Tiramisù que, alias, nem sempre gosto, provavelmente porque foi bem explicado em "curiosidades". Agora vou tentar fazer um usando da receita que voce passou. Quem sabe o meu vai ficar melhor do que muitos que já provei. ;)

Gosto de Massarpone que fui apresentada em anos mais recentes.

Beijocas

Fati said...

Não sei se gostei mais da estória ou da receita.
Vou pedir para minha Barbara fazer tiramissú!

Fati said...

Perdão, tiramisú

Unknown said...

Grande Allan!!! :)
Adoro quando vc ensina "receitas em prosa"!
Bjs

Liliane de Paula said...

O que gostei na Itália foram os limões sicilianos.

Deniserangel said...

Gostei da receita entremeada pela história. Lembra aqueles programas de TV em que se faz a receita contando casos. A propósito, estou assistindo a um desses programas agora: o da Palmirinha.
Pela descrição do doce que você fez, com certeza deve ser delicioso. Até deu vontade de fazer, se a preguiça deixar, hehe.
abraço, garoto

Liliane de Paula said...

Voltei para dizer que gostei da história.
Tiramisu? Acho que nunca comi.
Não gosto de sobremesas, porque não sei comer pouco, sobremesas.

Lúcia Soares said...

Toda vez que comi (poucas) o tiramissú, não gostei. Acho que preciso fazer eu mesma, com os ingredientes certos. A última vez que comi parecia azedo, acho que o mascarpone não estava bom.
Então...Fico deliciada com essas histórias com personagens enigmáticos, Lembram-me aquela seção de Seleções, "Meu tipo inesquecível".
Abraço.

Claudia Antonini said...

Receita perfeita! História deliciosa!