Sempre fui onívoro. Sempre. Mas sempre acreditei que a minha alimentação fosse sadia. Quer coisa mais sã que hambúrguer com cerveja? Ou uma angelical feijoada com tanta pimenta que faz arder os olhos? Um dia eu cresci e descobri que estava crescido demais e deveria ter descoberto muito antes que a única coisa que diferenciava o meu estômago da lata de lixo era a falta de embalagens vazias. No meu estômago, é claro!
O jornal satírico da tv italiana “Striscia la Notizia” declarou guerra no ano passado à cozinha molecular. Para esclarecer, é o tipo de cozinha praticada com aditivos químicos e que tem como expressão máxima Ferran Adrià, do restaurante espanhol “El Bulli”. Segundo o jornal, alguns aditivos químicos utilizados sob controle na indústria alimentícia, estariam sendo usados sem controle algum em restaurantes para obter resultados inesperados com o objetivo de impressionar. Bom, a coisa chegou a tal ponto que o Ministério da Saúde italiano resolveu intervir e baixou uma norma às pressas. E aí o caldo entornou.
Jornais europeus criticaram a medida mal feita do governo italiano, os chefs adeptos da cozinha molecular ridicularizaram o teor da norma, em contraposição com as normas europeias e que, entre outros equívocos, proíbe o uso de gases como ingredientes de alimentos, quando queria proibir o uso de nitrogênio líquido, que não é um gás (é líquido!). Se seguida ao pé da letra, a nova norma italiana proíbe aos restaurantes o uso de produtos aos quais nos acostumamos a usar mesmo em casa, como o fermento em pó. Os chefs tradicionalistas aplaudiram a iniciativa decretando que o Ferran Adrià e seus seguidores não deveriam estar em uma cozinha, mas em laboratórios. Enquanto isso, na Espanha, nasce a primeira universidade que formará chefs em cozinha molecular. Já há quem ameace batalhas de panos de pratos molhados.
Muito antes que a sigla OGM virasse o espantalho dos agricultores orgânicos, a Itália já consumia melancia, tangerina e uva sem sementes, além de batata enriquecida com selênio, além de outros produtos enriquecidos. E os diversos tipos de tomates desenvolvidos para determinados fins (molhos, saladas, etc.) também precisam ser lembrados como organismos geneticamente modificados – opa! Sim, sou consciente de que o risco é o monopólio das grandes empresas que controlarão – é uma questão de tempo – a produção e comercialização dos alimentos, além de desconfiar que a falta de tempo para testes mais profundos acaba nos transformando em cobaias, mesmo que indiretamente. Pois se a vaca comeu milho ou outro produto modificado, a carne, o leite e os seus derivados contém tais produtos. E eu estou consumindo sem saber.
A verdade é que eu não sei onde está a verdade. Gostaria muito de ter a tranquilidade de poder ir a um restaurante sem pensar que há algo no prato além dos produtos cultivados naturalmente no campo, mas toda essa guerra tem como foco convencer a mim, consumidor, de que estou fazendo a coisa certa. E eu não gostaria de descobrir que aquela coisa verde espumosa do jantar de ontem irá me transformar em um monstro fluorescente. Nem, tampouco, sentir-me ridicularizado por evitar o consumo de produtos que desconheço, o que me faz pensar que se fosse hoje, Galileu não teria convencido ninguém de que a cenoura não é venenosa. Tenho me aproximado cada vez mais dos alimentos que podem ser consumidos crus, como frutas e verduras, mas começo a olhá-las com desconfiança. Recordo que um agricultor na periferia de São Paulo usava água de esgoto para regar as suas lindas alfaces do mesmo modo que recordo do meu susto, ao chegar na Itália, pelos pimentões holandeses vendidos nos supermercados: todos com a mesma forma e dimensões, todos com a mesma tonalidade de laranja, amarelo ou vermelho, como se tivessem acabado de sair da fábrica. Curioso que Ferran Adrià tenha decidido fechar o próprio restaurante por dois anos, enquanto esclarece o ponto de vista dele sobre toda essa polêmica.
Lembro sempre da sabedoria da minha avó que me ensinava a não comer o que passarinho não bica, mas estão enganando até passarinho. O bicho grilo que vende produtos biológicos na feirinha biológica das segundas-feiras, descarregou os produtos de uma BMW X5 novinha e trocou de roupa antes. Eu vi. Na dúvida, estou pensando em voltar ao hambúrguer com cerveja.
9 comments:
em primeiro lugar obrigada pelo teu comentario, querido Allan, e sabe o que? acho que estamos engolindo, bebendo e respirando porcarias faz ja muitos anos, e logico com todas as novidades, etc, esta cada vez pior, TUDO!!!estamos sendo envenenados homeopaticamente, desde que sabe qdo!!!
um abraçO, e continua escrevendo voce sabe tanto!!!
Eu não duvido de mais nada! Passaremos fome? Não existe mais hamburguer honesto, se até mesmo o melhor restaurante do mundo "The Fat Duck" já fechou as portas em uma ocasião por ter intoxicado clientes!
Mari Arzak esteve no Brasil junto com Adrià para lançarem juntos azeites aromáticos e participaram de uma feira onde apresentaram alguns pratos. Meu irmão participa destes eventos porque é chefe, lembro de ter contado de uma sopa de letrinhas do Adrià bastante inusitada, que de longe parecia isopor colorizado. Sei lá, viu!
No meio eles são super respeitados, por facilitar a confecção dos pratos, por usarem tecnologia, saindo do tradicional. Eles quase que não usam ovos, usam a gelatina no lugar para dar consistência ao prato. Creme de leite, nem pensar! A proteína é artifical. Acho que entendo porque nao quer perder o gosto pelo hamburguer! :=)))
llan, esse é um grande problema que a nossa geracao está enfrentando. Às vezes penso se nao estamos comendo plástico. Já percebeu que tem queijo que nao derrete? Pois é.
Como por aqui a alimentacao é à base de muita salada e ainda comprada na fazendinha do bairro, nao corremos muito esse risco ainda.
Boa semana
Por isso que cada vez mais penso na minha hortinha, mas o problema é que não dá pra plantar tudo por lá. rs
Bacio carissimo
É isso, Allan... esse é um problema mundial... Infelizmente não temos como saber o que estamos comendo, bebendo e comprando. Mesmo fazendo nossa comida em casa, corremos o risco. É uma verdade triste e não existe uma solução. Fazer o que?...
Abraço da Lili!
Tenho certeza Allan que você deve se recordar do cheirinho convidativo dos frangos assados típicos dos domingos brasileiros, com muuuiita farofa...e quem não gosta da pelinha do frango?
Segundo um artigo de um professor meu :
"Uma pesquisa publicada na edição eletrônica do American Journal of Clinical Nutrition sugere que após o diagnóstico de câncer de próstata, o consumo de pele de frango e ovos aumenta em até duas vezes o risco de gravidade do tumor. Surpreendetemente o consumo de carne vermelha não influenciou o andamento dos tumores. O estudo foi realizado com 1294 homens durante dois anos e publicado em dezembro de 2009. Claro que mais pesquisas são necessárias, mas evitar pele de frango e excesso de gema de ovos parece prudente para todos. Principalmente homens com diagnóstico de câncer prostático, uma vez que apresentam risco coronariano e de diabetes aumentados."
Depois você confere lá no Blog do Leonardo Gama, o cara é fera, vale a pena.
O grande problema é: Como se adaptar a uma alimentação saudável nos dias de hoje em que os minutos são contados por conta da vida corrida? Infelizmente os fast foods ganharam mercado às custas da correria do dia-dia trocando a saúde gradualmente pelo tempo contado e nos "adaptamos" tanto isso que mesmo nas férias quem liga para as saladas e carnes grelhadas? vale mais "bate-entope, como dizemos aqui, um morte-lenta.
Bjos Allan. t+
bom dia e muito obrigada pelo teu lindo comentario! e quero ler mais coisas novas tuas
um gde abraço,
E bicho grilo tem que andar de bicicleta?
Deixa a moca dirigir a BM dela...eu ate que fiquei com inveja. E se ser bicho grilo da carrao novo, vou ja comprar a minha batinha e abrir uma lojinha na praca.
Voce escreve muuuito bem! To adorando!
www.inaier.blogspot.com
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