Nesse jogo de comparar diferenças quando se vive no exterior, tem uma fácil de notar, na Itália: a relação com a família. Não que não existam as crises, o abandono e todo o tipo de problemas que enfrentamos no Brasil, mas, de um modo geral, os laços familiares italianos são mais fortes que os nossos. Ou, pelo menos, a demonstração de afeto e uma convivência que pode beirar ao sufocamento.
Ao longo dos anos vamos deixando amigos, parentes e conhecidos pela estrada. Não que eles parem e nós continuamos em frente, mas apenas seguimos caminhos diferentes. E esses caminhos podem nos levar a lugares distantes, às vezes morando na mesma cidade. É muito provável que o seu amigo e colega de trabalho italiano deixe de sê-lo se um dos dois sair da empresa. Os telefonemas vão escasseando, viram sms e, depois de algum tempo cessam de vez. Por outro lado, as pessoas se assustam quando me ouvem dizer que minha filha Luiza pretende se formar, viver dois anos em Londres, dois anos em Paris… “Como você vai suportar? …Como consegue falar isso com essa calma?!”
Às vezes passo horas pensando e me preocupando com amigos ou parentes que não vejo há mais de vinte anos. Sim, amigos. Porquê enquanto eu pensar e me preocupar com eles serão sempre meus amigos, mesmo que o último contato tenha se perdido na poeira da minha memória. E, caso eu o/a encontre, vou reagir com a mesma intimidade de vinte anos atrás, com um abraço apertado de saudade e a intimidade do papo de ontem, quando pensei nele ou nela pela última vez.
Claro que com meus irmãos e minha mãe acontece o mesmo, com a diferença que penso neles com mais frequência. “O que minha mãe me diria” ou “o que meu irmão faria nessa situação” são questões com uma frequência sã no meu dia-a-dia. Às vezes até para agir de modo contrário, mas eles estão sempre presentes nas minhas decisões. O problema é que isso não basta. Gostaria de ter a proximidade física, de poder passar para um café ou …Não, café não. Uma cerveja ou um churrasco. Conversar descontraidamente, com meus sobrinhos em volta e minhas filhas penduradas nos pescoços dos tios e da vó. Nisso somos iguais aos italianos e à maioria dos povos desse mundo caótico e carente de relações sinceras. A diferença é que um italiano dificilmente aceitaria que o próprio filho partisse para viver tão longe.
E é por pensar com frequência nos meus irmãos, apesar de falar muito pouco com eles, que há dias tenho pensado no meu irmão caçula, o Bruce, que faz aniversário hoje. Porquê aquele sacana não manda umas fotos dos meus sobrinhos? Como estará a Sueli? E a casa, terminou? Recebeu os prêmios? Perdeu meu e-mail e número de telefone? Você se lembra das suas sobrinhas? E todos os puxões de orelha que um irmão mais velho se sente no direito de fazer. Na verdade, estou escrevendo hoje só para lhe dizer que sentimos muito a falta de vocês, que lhe desejamos um dia de festa, com a Bárbara, o Eduardo, a Sueli, a mãe e os manos Dawidson e Cecil com as cunhadas e amigos que lhe façam sentir especial, mesmo não sendo a nossa uma família italiana.
Abração e um Feliz Aniversário!
15 comments:
Puxa, que bacana esta carta-post-homenagem! Se eu gostei, acredito que seu irmão vai ficar todo prosa.
Você me fez refletir sobre como nos afastamos das pessoas e nem nos damos conta.Às vezes penso que deveria ligar, enviar torpedos ou emails e concluo que as relações estão cada vez mais virtuais.
Mas, por outro lado, esta conectividade nos aproxima, de certa forma, porque permite que texto, voz e imagem nos mantenha em contato.
Nada susbstitui, no entanto, o encontro, o abraço, a confraternização ao vivo.
Feliz aniversário pro mano, aí!
abraço, garoto
Emocionei-me com este post-homenagem pois me identifiquei com as circunstâncias em que você vive, longe da família de origem. Aqui em BH tenho próximos dois irmãos; os outros 7 (!) se dividem por outras cidades. Meus pais estão no 'interior' de Minas. A distância não se compara com o além-mar, mas às vezes as montanhas são obstáculos tão concretos...
Primeiro eu gostaria de dizer que me considero seu amigo, porque mesmo que não escreva aqui sempre que venho (e sempre venho) a vinda é uma forma de lembrança. Segundo gostaria de dizer que você é um sujeito fantástico. Parabéns por ser como você é. Eu gostaria muito de ter um irmão como você, mesmo que fosse longe. Grande abraço do leitor tão assíduo quanto calado.
De certa forma, o que escreveste é o mesmo que escrevi hoje e o que costumo escrever com uma certa frequência no Sopa no Exílio: as relações entre as pessoas, família, amigos.
Acho que isso é o mais importante da vida, e é isso que nos aproxima.
abraço!
Vivo a mesma situação. Casada com italiano, embora goste e me dê super bem com minhas cunhadas, a frequência com que eles se juntam para comemorar qualquer coisa me sufoca. Das 20 e tantas festinhas familiares, vamos em 10% e olhe lá. Sempre acho que parente e/ou amigo tem que sentir saudade e não saturação. E tenho filho morando fora há anos pelo qual morro de saudade. E acho bom pra ele estar onde está e fico feliz, apesar da saudade. Talvez seja um paradoxo ou talvez seja simplesmente essa nossa mescla italo-brasileira, né?
Allan, posso entender bem seus sentimentos, pois o mesmo acontece comigo. É com tristeza que eu também perdi pelo caminho alguns amigos que eu sinto ainda saudades, mas tb é com alegria que recuperei uns bem importantes prá mim, pois fazem parte da história da minha infância no famoso orkut da vida. E eu me senti tao feliz depois disso que parece que eles vivem aqui comigo.
Quanto a filha a ficar 2 anos fora, é preciso. Precisamos deixar nossos filhos voarem com suas próprias asas, asas essas que ajudamos a crescer.
Emocionante o post.
Boa semana
Oi, Allan!!! Que linda mensagem vc escreveu para seu irmão! Espero que ele tenha se emocionado tanto quanto eu! Saiba que vc é um amigo muito querido, e apesar da distância e da situação virtual, eu o considero muito e o visito diariamente. Imagino o tamanho de sua saudade dos irmãos e amigos que ficaram no Brasil, mas, o importante é o que se tem no coração, e isso, distância alguma é capaz de separar. Grande abraço, da amiga Lili.
Nossa, muito legal. Parabéns.
Bom vc já esta linkado e não tive resposta sobre aquela carta. Na verdade ele nem sabe que existe.
Abs,
Já passei por muitas fases: a de precisar de amigos por perto e mendigar por eles, de esperar que alguém me ligue ou escreva, de me isolar e só cuidar dos filhos, da perda de avó e mãe quase juntas... Mas hoje tenho poucos e bons amigos, aqueles que parecem amigos de infância mesmo;já não tenho secretária eletrônica, pois quem quiser sabe onde me achar...rs, e tento fazer as asas dos meus filhos baterem forte, pois não estarei aqui prá sempre...estarei na Itália...KKK
Olá,Allan!Foi bom ter sua visita aos filhotes adorados.Desde já também acompanhando o seu. E,saiba que compartilho sua idéia da importância de manter um bom relacionamento em família apesar da distância geográfica com nosso país.Na maioria das vezes me sinto também assim aqui,embora hoje dispondo de tantos recursos de comunicação imediata, eu pessoalmente, choro cada vez que recebo 1 carta de meus pais do CE.Abraços,Bergilde
Distãncia é relativa mesmo: eu converso mais com uma prima que não vejo pessoalmente há vinte anos e mora nos EUA, do que com várias primas que moram pertinho de mim.
Sei lá.
Mas quanto aos pais e ao meu filho, hum, aí penso diferente: preciiiiso ficar perto...rs
A Lu sempre me fala isso, que a família na Itália é mais unida e mais próxima que aqui no Brasil. Ela acha que o conceito família aqui no Brasil caiu por terra e eu concordo em partes.
Enfim, não sei precisar o que houve, mas nos últimos anos a coisa se descaracterizou completamente. Fico tentando buscar respostas, mas ainda estou em fase de observação.
Grande abraço e boa semana
Legal isso que você escreveu. É, a comparação é inevitável quando estamos na condição de imigrante e acho que quando retornamos para a pátria também. Boa semana e feliz aniversário atrasado para o seu irmão.
Distância geográfica não significa distância da alma, né?
Lindo seu texto Allan, é assim que sentimos os amigos, presentes em nosso pensamento e quando os reencontramos anos depois parece que estivemos juntos ontem.
Vivo longe da minha família, a última vez que estive com meus 4 filhos juntos faz 11 anos! Meu mais velho mora em Washington, minha filha em Estocolmo, o menino do meio em Campinas, o caçula em São Paulo, minha mãe em Botucatú, interior de SP, um irmão em Luanda, Angola e outro em S.Paulo, eu aqui em Salvador com meu marido, é complicado fazer todos estarem juntos, porém graças à essa maravilha da internet eu tenho contato com todos quase que diariamente, seja por email, pelo skype, pelos blogs, vou contando a minha vida e vou sabendo da deles, só falta mesmo o cheirinho e o calor de um abraço gostoso...
beijo
Juju
Oi, Allan. Achei seu post sobre família e amigos de uma sensibilidade muito grande. Nem me lembro mais como foi que encontrei seu blog mas foi uma descoberta fantástica. Me sinto muito feliz em lê-lo sempre que posso e depois que você separou seus posts por assunto ficou muito mais prazeroso e objetivo. Este marcador ("Eu mesmo") será campeão de audiência, tenho certeza. Abraços.
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