Sunday, April 26, 2009

O Eu Meteorológico

Chove e faz frio; na montanha voltou a nevar. É o adeus anual do Inverno azedando o humor italiano neste início de primavera. Curiosamente é o clima que mais me faz lembrar do Embu, em São Paulo. Sim, curioso porque no Embu também faz sol, calor e quase todas as outras manifestações atmosféricas. Noites frias e chuvosas embuenses, bebericando conhaque num bate-papo com amigos.

As tardes frescas da primavera italiana me lembram Assis, sempre em São Paulo. Horas e horas esperando o peixe que nem sempre mordia a isca, o que não chegava a incomodar a descontração ou as risadas provocadas pelos ‘causos’ narrados pelo seu Zé, sogro e amigo. Nem só de memória gastronômica vivo eu, mas essa associação com o clima tem a capacidade de me fazer reviver momentos e lugares como nenhuma outra circunstância.

Algumas experiências são únicas, como a primavera em Sampa: saía de casa com pulôver e casaco na manhã gelada; por volta das dez o calor e a umidade provocavam uma sensação de coceira, como se milhares de agulhas me espetassem todo o corpo, numa agonia que me obrigava a ficar em mangas de camisa o mais rápido possível e sem saber o que fazer com os agasalhos incômodos. Lá pelas três da tarde, com o calor que fazia, ninguém suportava sequer olhar para os casacos e roupas de lã, amontoados em um canto qualquer. Voltava para casa cansado, com frio, os olhos vermelhos e ardendo, consciente de que a cena se repetiria no dia seguinte. O verão no Rio é inigualável, não só pelo calor mas pelo ar que se respira. Uma sensação de casa como em nenhum outro lugar, diferente do verão de Salvador, ventilado e festivo, mas onde me sentia sempre como alguém de passagem, apesar dos quase 12 anos vividos lá. Reencontrei o clima de Ilhabela aqui na Itália, na ilha d’Elba, talvez por ambas serem ilhas, mas em Elba não tem borrachudos.

Óbvio que a neve é uma ocasião especial e incomparável com os diversos climas no Brasil. Nem chego a ter certeza de que sentirei saudades dela. Ir trabalhar debaixo de neve está longe do meu conceito de divertimento. Depois, carioca que sou, prefiro o mar à montanha. E agradeço aos céus que nem todos pensam como eu.

Enquanto houver memória haverá história. Troquei o conhaque pelo vinho, o ar não é aquele do Rio nem a brisa é a mesma de Salvador. Na última vez em que seu Zé esteve aqui pescamos mais peixes que em muitas tardes à beira do Paranapanema somadas. As estações costumam ser mais marcadas e aprendemos as ocasiões em que se deve levar um casaco, ainda que por precaução. Mais uns dias e a primavera torna senhora da vida. E eu nem sinto saudade dos borrachudos.

7 comments:

Lunna Guedes said...

Carissimo, as estações do ano há muito tempo causam saudades em mim dos lugares por onde eu passei nesse anos todos. Em Gênova, a primavera era salgada, por causa do mar. Em Coimbra era seca durante um pequeno tempo e depois era úmida. Em Londres era chuva dia sim, dia também e tudo era muito cinza.
Nossa, nunca tinha parado para pensar nesses pequenos detalhes. Interessante isso. Abraços meus

Meire said...

E viva a primavera!

Allan voce rsponderia as perguntas da minha sessao "51 perguntas para um blogger"?

Bjs

Unknown said...

oi Allan

aqui faz sol e calor, céu azul... (veja as fotos no meu outro blog http://jussaragehrke.blogspot.com)

faz 9 dias que chegamos, é tanto trabalho na casa que não tive tempo de sair, quando passar pela Estrada do Coco vou lembrar de vc.

beijo
Ju

Segunda impressão said...

Sem memória não há história mesmo!
Aqui no Rio tb está mais ou menos assim...chove muito e, daqui a pouco o sol(embora de outono)entra em cena novamente.
Fiquei curiosa...Vc já está há quanto tempo fora?
Abraço.

Segunda impressão said...

Uau! Vc já é um cidadão italiano, então! Com coração brasileiro, claro!:)
Ótima semana!

Lilica said...

Allan, manda a primavera vir logo. Pq eu, boa carioca que sou, estou muito mal humorada com este frio e chuva.
Beijos

Beth/Lilás said...

Oi, Allan!
Vim conhecer teu cantinho hoje com mais tempo.
Obrigada pela participação da blogagem do Movimento Natureza que eu e Georgia idealizamos.

Quanto ao seu texto sobre os diversos climas aí e aqui, o que permeia mesmo é a saudade ainda deste Brasilzão e a felicidade em morar nesta beleza que é a itália.

abraço carioca