Conversa De Botequim

Caros e Caras,

Paz e saúde!

- Tomamos uma grappa?

- A essa hora? Melhor não. Garçon, uma garrafa de gutturnio fermo, que esse negócio de vinho tinto frisante é coisa de piacentino viado.

- Pronto, 'tava demorando…

- Você viu que o Fazio, mesmo sendo o governador do Banco Central, está sendo investigado desde junho por causa da venda do banco Antonveneta?

- Mas não vai dar em nada: é tudo parte da grande coreografia política para as eleições do ano que vem.

- …Que, pelo visto, terminará como na Alemanha. Mas que um peixe graúdo como o Fazio ia fazer bonito na cadeia, ah, isso ia.

- Ia mas não merece. Pelo menos não no caso do Antonveneta. O Banco Central Europeu já investigou e não encontrou nada de anormal na operação de venda do banco aos holandeses. O conselho do próprio banco também analisou a questão e renovou a confiança no Fazio. Pelo que foi divulgado até agora pela imprensa, o único motivo pelo qual o Fazio está sendo julgado é o fato de ter autorizado a venda de um banco italiano a estrangeiros. Mas isso o mundo inteiro faz.

- E qual seria o motivo que o faria merecer ir pra cadeia?

- Trouxe o gutturnio, que infelizmente é frisante. Trouxe também uma garrafa de barbera. Qual o senhor prefere?

- Abre o barbera…

- Aos homens fortes e às mulheres bonitas!

- Tin tin.

- Você deu a entender que o Fazio teria outro motivo pra ir em cana. Qual é?

- Bom, no caso da Parmalat… Ninguém dá um calote de quinze bilhões de euros sem uma consistente participação das instituições financeiras. E eu não me refiro a bancos pequenos.

- Quer dizer que tem peixe muito graúdo nesse aquário?

- Quero dizer que esse aquário é grande como o mar. E que os tubarões que nadam nele são enormes como baleias. Com uma fogueira grande como quinze bilhões de dólares, o Banco Central deveria ter visto a fumaça. Se viu e não fez nada, foi conivente. Se não viu, foi incompetente. Qualquer que seja a hipótese, o governador mereceria ser demitido, no mínimo.

- Mas o cargo dele é vitalício…

- Porque o país é a Itália, onde o primeiro-ministro cria leis para proteger os próprios interesses, como descriminalizar o balanço empresarial falso, que o livrou dos últimos processos.

- Ou onde a polícia pode sequestrar e leiloar a lambreta de quem não possuir habilitação ou não usar capacete…

- O que me impressiona nessa nova lei é que ninguém diz nada. Aceita-se uma arbitrariedade absurda dessa como se fosse uma coisa normal. O sujeito compra um veículo, paga por ele, paga os impostos e o governo toma posse do bem por que é mais fácil que multar! E ninguém faz nada?!?!?

- Mas nos Estados Unidos o governo também toma propriedades dos cidadãos…

- Você anda vendo muito filme americano. O governo deles toma a propriedade de quem tem débito de impostos, não de quem foi multado.

- …

- Quem deve ‘tá rindo com tudo isso é o Calisto Tanzi, da Parmalat…

- Você viu a declaração dele? Diz que está sereno, que vai enfrentar o processo como uma catarse…

- Eu também estaria catártico se soubesse que quando tudo acabar terei quinze bilhões de euros pra gastar.

- E ele garante que não desviou nenhum centavo, que perdeu tudo. Que cara de pau! Só falta alegar que não se lembra o que fez com o dinheiro…

- Como a mulher que perdeu a memória: não lembra de ninguém. Filhos, marido, ninguém. Só do Berlusconi. Também será parte da tal coreografia política?

- Os cientistas estão estudando o caso dela. Alguns sugerem que essa memória seletiva seria uma lembrança do ícone, ou algo assim.

- Ícone? Berlusconi?

- …

- Outra garrafa de barbera, senhores?

- Melhor duas grappas. Duplas.

- Em copo alto, por favor.

- Bem alto…

Ciao.