Sunday, July 04, 2004

Limites

Caros e Caras,
Paz e saúde!

O sujeito acabara de chegar para assumir como capitão de um rebocador no cais do porto. Além de manobrar navios, deveria socorrer embarcações em dificuldades e a sua chegada foi logo sendo batizada: uma tempestade estava afundando um pesqueiro que enviara um pedido de socorro. Não havia tempo a perder. O comandante da pequena esquadra mandou-o demonstrar o que sabia e ofereceu:
- Temos dois rebocadores: o primeiro é um equipamento moderno, com potência equivalente a quarenta remadores; o segundo é um barco de quarenta remadores que se usava um tempo, em perfeitas condições. Escolha!
- Quero o barco com os remadores – respondeu.
Entrou no mar com sua equipe sem saber se conseguiria. Com muita dificuldade alcançou o pesqueiro, embarcou os tripulantes apenas em tempo de ver uma onda engolir de vez o que restava dele, voltou ao cais após meia hora de luta contra um mar realmente terrível e ouviu do comandante:
- Parabéns! Ótimo trabalho! Mas, me diga: porque escolheu o barco com os remadores?
- Porque eu sabia que o outro barco tinha um limite de potência equivalente a quarenta remadores, enquanto naquele barco a equipe poderia se superar e alcançar uma potência superior.

Descobri que por mais que eu me esforce em ações diárias e repetitivas, alguns de meus limites não são superados. Por exemplo: salames de diversos tipos e regiões, presuntos, copas de Parma e piacentinas, queijos e mais queijos e mais queijos regados por vinho e cerveja. Nada! Não consigo ultrapassar os oitenta e dois quilos. Este é o meu limite. Talvez se eu fizesse como aquele americano maluco e passasse um mês comendo em fast foods… mas eu prefiro slow food. Por outro lado seria uma boa oportunidade de ficar famoso. Esses americanos fazem coisas malucas, ficam famosos, escrevem livros que vendem às toneladas e são fotografados passeando em Holywood com cara de star. Se alguém aí tiver uma idéia maluca que valha um livro de sucesso, me avise.

Outro de meus limites refere-se à capacidade de compreender certas atitudes. Em alguns casos me encontro logo acima da linha onde está escrito a palavra “obtuso”. Estou vivendo essa constatação neste momento: 30 de junho passado entrou em vigor a lei que obriga aos menores – de 14 a 18 anos – a possuírem uma mini habilitação para pilotar ciclomotores até cinquenta cilindradas. Um ano após o governo instituir a habilitação com pontuação, como temos no Brasil. Tudo feito para conscientizar motoristas e reduzir acidentes. Até aqui, tudo bem. Nenhuma dificuldade. Mas vou precisar da ajuda de alguém mais esclarecido para entender porque o mesmo governo permite que diversas marcas coloquem no mercado um carro que – oh ser iluminado! – não necessita de habilitação. E com direito a propaganda em televisão, explicando direitinho que pode ser guiado pelos mesmos jovens que não conseguiram passar no exame para obter a mini habilitação. O meu pedido de ajuda é sério e vou aguardar pacientemente. Mas não se preocupem se não for possível mandar-me a resposta senão no dia seguinte a eternidade. Vou aproveitar o tempo para exercitar-me sozinho.

Quanto aos limites italianos, posso citar dois. O primeiro é a incapacidade de compreender a filosofia do futebol. Aquela que diz que ganha o time que faz mais gols. Eles acreditam que deve ganhar o time que leva menos gols. Não vão entender nunca! Basta ver o resultado da Euro Copa que se encerra amanhã. Já tentei argumentar que no país do futebol goleiro é sinônimo de quem era o dono da bola mas jogava mal; que “O Time” de 70 possuía Jair, Tostão, Gerson, Pelé e Rivelino, cinco artilheiros nos seus respectivos clubes; que Taffarel é mais conhecido entre nós como frangarel; que Dida é o primeiro goleiro brasileiro respeitado e que ninguém lembra os nomes da defesa dos times. Nada! O goleiro Buffon e os defensores Nesta, Maldini e Cannavaro são as estrelas do time italiano (e olhem que Maldini se recusou a ir à Euro Copa!).

O segundo limite a que me referi é o verão. É neste período que as pessoas se convencem que deveriam ter feito uma dieta mais longa que uma simples segunda-feira. Também é a época em que todos começam a frequentar academias, numa euforia que terminará com a estação. E é quando os italianos do Norte se esquecem das diferenças com os vizinhos do Sul e invadem as praias da região meridional. Aliás, uma recente pesquisa descobriu que os italianos do Sul estão mais preparados (profissional e culturalmente) que os do Norte.

E por falar em verão, aproveito para dar uma receita muito simples (atendendo a reclamações): Insalata Caprese. Rodelas de tomate cobertas por rodelas de mozzarella de búfala. Um fio de azeite extra virgem e folhas de manjericão fresco. Sal, somente o da mozzarella. Acompanhado por um vinho não muito seco nem robusto, tinto ou um verdicchio, pão e dois minutos de prosa.

Uma outra fábula conta de dois sujeitos em um pequeno bote. Um deles diz: “Tem um furo no teu lado do barco…”

Semana que vem conto a estória da equipe italiana de remo, presenteada pelo diretor e mando uma receita mais adapta ao inverno brasileiro.

Ciao.

7 comments:

Anonymous said...

Allan, que legal a história do capitão! Dá mesmo espaço pra muita reflexão. Dá pra pensar na união, no esforço coletivo...

E a frase do sujeito no bote pequeno "Tem um furo no teu lado do barco…". O sentido é totalmente oposto, o "cada um por si", sem a percepção de que isso prejudica todo mundo...

Sábias palavras!

Um abraço,

ninha - http://www.doislados.blogger.com.br

Anonymous said...

Começava a estranhar os "sabores" descritos no subtítulo do teu blog. Finalmente uma receita!
Quanto às antíteses governativas, creio que nenhum dos seus leitores será tão "brilhante" para fornecer uma resposta.
Abração,
Frank & Gaia

Anonymous said...

Habituei-me a ler o teu blog e descobri que o preconceito bobo que eu tinha contra os blogs eram somente isso: preconceito bobo.
Lenine
PS- Se escreve ciao mas lê-se tchau, não é mesmo?

Anonymous said...

Allan,
Mais uma vez venho beber da tua água. Não é sede, é vício. Algo me diz que estamos vendo o nascer de um grande escritor.
Abraços,
Diogo diogom@hotmail.com

Rafael Galvão said...

O Brasil teve vários goleiros respeitados, ainda que todos tenha tido seus altos e baixos. Manga, Castilho... Certo, não dá para incluir Félix E Muito menos Waldir Perez. Taffarel foi considerado, durante muito tempo, o melhor goleiro brasileiro, sim, principalmente entre 90 e 95. Já o Dida não é exatamente "respeitado" por aqui, e em momento algum foi considerado -- por maioria, que é o máximo que se consegue em futebol -- o melhor goleiro brasileiro (nos últimos anos, esse lugar pertenceu a Veloso do Palmeiras, Élton do Vasco, e alguns outros). Mesmo com todo aquele tamanho, Dida tem sérias dificuldades para sair na área e, com a bola nos pés, comete algumas tragédias de vez em quando. Hoje, por exemplo, muita gente acha Júlio César melhor goleiro (eu entre eles, mas como flamenguista cada vez mais enrustido sou suspeito... :)

Allan Robert P. J. said...

Acho meio estranho responder no meu próprio blog, mas va lá...

Ninha, a intenção foi essa mesmo: de fazer ver os dois lados da moeda. Abração.

Rafael, aqui na Europa o Dida é visto como um dos melhores goleiros do mundo. Talvez porque na época dos outros goleiros citados por você (a partir do Manga) a televisão tinha um público quase exclusivamente local. Lembro que as fitas de novelas eram levadas de São Paulo para o Rio (ou vice-versa) de ônibus, para que o capítulo pudesse ser visto no dia seguinte. De qualquer forma, como bom flamenguista que sou (ou fui) não posso deixar de sonhar com o Dida na Gávea. Abraço procê também.

Allan Robert P. J. said...

Desculpem!
Lenine, sim, se escreve "ciao" mas se pronuncia como o nosso (deles) tchau. Brigado.

Diogo, não venha aqui pra elogiar, não. Gosto mais quando você critica.

Ciao