Wednesday, June 09, 2004

Celular

Caros e Caras,
Paz e saúde!

Na Itália a epidemia do celular já passou. Ou transformou-se. Transformou-se numa ode à incomunicação. O uso indiscriminado do telefone celular já foi objeto de muita reclamação e não pretendo ser redundante. A minha atenção vai para um fenômeno que se difunde na mesma velocidade do consumo de celular pela camada mais jovem: a solidão coletiva.

Em longas caminhadas para fumar meu charuto ou simplesmente para admirar a secular arquitetura italiana, tenho observado cada vez mais a ocorrência de uma atitude bizarra: grupos de jovens que conversam animadamente… com outras pessoas, pelo celular! É triste e ao mesmo tempo divertido. Noutro dia reparei num rapaz que fingia estar falando com alguém ao celular, enquanto controlava com o canto do olho a conversa animada do seu amigo, também ao celular. Quando o amigo acabou de falar e desligou a sua pequena maravilha, o primeiro também desligou a sua, esquecendo-se de despedir-se do amigo imaginário. Infelizmente não é uma cena rara.

Existe um frenesi muito grande em torno da pergunta: “O que a gente vai fazer hoje à noite…?” Opções não faltam: discotecas, bares, restaurantes, shows, cinemas, ópera, teatros, quermesses de paróquias, etc. Em todo lugar, jovens que falam ao celular. Não que eu me sinta velho ou não tenha um celular, mas o meu telefone serve somente para o indispensável: avisar que vou me atrasar, chamar o guincho às quatro da manhã ou pedir a lista do supermercado que esqueci sobre a mesa da cozinha.

Na impossibilidade de serem famosos, visto a alta concorrência desses dias, os jovens italianos (e não somente eles) procuram sentir-se importantes transmitindo pelo celular uma euforia típica de pré-festa, que, pelo jeito, nunca chega. Essa euforia é retransmitida pelos seus amigos e pelos amigos dos seus amigos, numa corrente de Santo Antônio que já deu oito voltas ao redor do mundo, como aquelas da internet.

Isso sem falar nas terríveis musiquinhas! É simplesmente impossível ouvir o mesmo som em dois celulares diferentes, assim como ouvir o mesmo som no mesmo celular por mais de quinze dias. Minhas filhas inseriram a melodia de “Atirei o Pau no Gato” no celular da minha mulher.

E, assim, para delírio de psicólogos e médicos que estudam os efeitos dos campos magnéticos no ser humano, o final de semana se aproxima na Itália e, com ele, a pergunta “O que a gente vai fazer essa noite…?” se espalha pelos cafés, portas de escolas, ruas movimentadas e qualquer outro lugar onde haja um jovem e um celular. O que segue depois, é a barbárie.


Ciao.

3 comments:

Anonymous said...

pq vc nao coloca umas imagens pra melhorar o visual?
pedroluis

Anonymous said...

Olá Allan, ainda não entendi esta do blogger, se não nos cadastrarmos temos que postar como anônimos? Então assim vai. Poderíamos dizer que os jovens vivem uma fase de marketing via celular. Sem se encontrar, cada um conta maravilhas do que estão fazendo ou do que farão. Essa irrealidade é o alimento mais forte desta falsa alegria prisioneira da solidão. Vim aqui agradecer tua visita ao meu blog. Concordo plenamente com o que escreveste lá e é o que eu penso. Depois de enumerar várias razões para não se escrever sobre a primeira idéia, confesso que fiz justamente isto, escrever sobre a primeira idéia. regra final, não há regras. E finalizando, não se preocupe com as imagens, boas palavras já são ótimas imagens. O que a foto de um celular ia ajudar em teu texto? Sua descrição de cena já fez tudo. Naldinho www.mblog.com/singrando

Anonymous said...

ler todo o blog, muito bom