Você sabe como funciona o sistema eleitoral
italiano? Não? Tudo bem, também não sei e não vou tentar explicar. Aliás, ninguém
sabe, nem mesmo os políticos italianos ou a imprensa. Pra falar a verdade, somente
três pessoas sabem como funciona exatamente a lei eleitoral na Itália, mas eles
fizeram um pacto de sangue e nem a máfia conseguiu extorquir alguma coisa
deles. E se você não sabia antes, também não tem motivo para querer saber
agora, já que a Corte Constitucional da Itália decretou nesta quarta-feira, 4 de
Dezembro, que a lei eleitoral – até então vigente – é inconstitucional.
#prontofalei.
A Lei 270 de 21 de Dezembro de 2005 foi
formulada pelo então Ministro Para as Reformas Roberto Calderoli. Poucos meses
após a nova lei entrar em vigor, o próprio ministro já tinha se convencido que
a lei era uma porcaria. Durante uma entrevista, Calderoli declarou que a nova
lei era “una porcata”.
Segundo o Dicionário
“Il Sabatini Coletti”:
Porcata [por-cà-ta] s.f.
1 Atto disgustoso, maialata: non fare porcate a tavola!; oscenità, frase
scurrile, indecente, o anche ignobile: film pieno di porcate
2 Azione o comportamento indegno, sleale: fare una p. a qlcu.
3 fam. Prodotto scadente, schifezza, porcheria: questo libro è una p.• a. 1928
Após a entrevista do ministro, que a definiu
como porcaria, a nova lei foi batizada com o hoje popular nome de “Porcellum”
(de “porcello” – pessoa mal educada,
que suja tudo).
O advogado Aldo Buzzi (79 anos) junto com outros 25
cidadãos contestaram o Governo e o ministro do Interior, diante do Tribunal de
Milão, em Novembro de 2009. Sustentava Buzzi que durante as eleições ocorridas
após a nova lei, e principalmente nas eleições de 2006 e 2008, o direito de
voto teria sido vilipendiado, pois não teria ocorrido segundo a modalidade
fixada pela constituição, não garantindo o voto “pessoal e igual, livre e
secreto, com sufrágio universal e direto”. O sistema Porcellum não
permite ao eleitor escolher o próprio candidato, mas o obriga a votar em uma
lista apresentada pelo partido ou coalizão, na qual a ordem na lista será
respeitada. Desse modo, o eleitor pode votar numa lista por causa de um
candidato, que não será eleito em detrimento de um outro candidato, mesmo não
tendo cooptado voto nenhum, pelo simples fato do candidato eleito aparecer
antes do outro na lista.
Nenhum governo, desde 1994, conseguiu concluir o
próprio mandato. As forças políticas se reinventam e se alternam no poder,
desde então. A consequência é uma contínua mudança nas regras, nas leis e na
vida dos eleitores, com resultados devastantes na economia e na credibilidade
do país.
Em 2006 venceu Romano Prodi, bastião da
esquerda italiana. O governo dele caiu e as novas eleições elegeram Silvio
Berlusconi, expoente da direita. O governo dele caiu, mas foi mantido no cargo
com uma nova formação. Esse governo também caiu – não me perguntem quando, aqui
todo dia cai um governo – e foi substituído (sem eleições) por um governo “técnico”,
presidido pelo economista Mario Monti. Que também caiu. Novas eleições, em
2013, decretaram o que a sabedoria popular já sabia: o sistema político
italiano não funciona, nunca funcionou. O Movimento 5 Estrelas, liderado pelo
cômico Beppe Grillo, foi o que mais políticos elegeu, mas nenhum partido obteve
a maioria necessária para governar. A esquerda e a direita se uniram para
formar o atual governo, que também não funciona. O país permanece estagnado,
sem reformas, sem rumo.
Nesse meio tempo o advogado Buzzi perdeu a
causa e recorreu. Recorreu e recorreu até que ela fosse avaliada pela Corte
Constitucional. Agora é oficial: o sistema eleitoral italiano é
inconstitucional.
Ficam no ar
algumas questões:
1)
Como é possível que a justiça leve quatro anos para julgar, em via
definitiva, a inconstitucionalidade de uma lei que pode mudar um país?
2)
A Corte Constitucional precisava mesmo esperar que um grupo de
cidadãos solicitasse a consulta da constituição? Não poderia ela mesma propor a
consulta, anos atrás?
3)
Se a lei é inconstitucional e o congresso foi eleito por essa lei,
o próprio congresso não é ilegítimo?
4)
Você sabia que a receita original da pizza margherita leva somente
mozzarella, tomate e manjericão, e que o orégano de que você tanto gosta não
entra?
.
15 comments:
Muito bom o post! Eu leio, vejo o jornal todo dia mas é muito difícil acompanhar pois tem sempre uma mudança, uma nova lei, uma nova taxa.... E quanto ao finanziamento público aos partidos... onde vai parar esse dinheiro? Ninguém sabe, ninguém viu!
Bom dia!
A única coisa que eu entendi é que no final tudo acaba em Pizza, hehehe. Quando eu abrir o meu pacotinho de mussarela de buffala ou quando eu comer um suculento prato de risoto (que eu adoroooo), me questionarei: como um povo que teve a genialidade de inventar isso tudo, comete a insanidade de eleger (repetidas vezes) o Berlusconi? Não dá para entender! :-(
infelizmente este belissimo pais que adro, esta , e, sempre foi um caos politico.....que pena!!!!
abraco
"Qui imbróglio", não?!
Aí, como aqui...onde nem tudo funciona e na política funciona menos ainda. Desconfio que nenhum sistema político é legal para o cidadão.
Meio desanimador.
Um abraço, Allan.
Aí , como aqui, é que as leis sejam tão mal-redigidas que permitem interpretações, sempre a favor de quem manda mais, claro.
O PT está arduamente tentando implantar aqui esta picaretagem que é a tal da "votação por lista ".
( vai aparecer aí assinando o comentário o velho Peri S.C., já que estou logado no Blogger, mas é o Mauro M mesmo, abraço )
E no final tudo acaba em pizza brusqueta e etc?
Boa semana amigo!
Estou me matando de rir aqui!!! Parece texto de comédia italiana!!!!
Não sabia de pizza sem orégano, mas se tem manjericão, tudo bem!!
Este último páragrafo foi só pra conferir se o povo tá lendo seu post até o final, é?
Alguns países são tão maravilhosos que tem na política o seu grande defeito, pois não seria justo com os demais que tem catástrofes naturais como problemas.Acredito que Brasil e Itália são assim, nossos políticos são nossos grandes problemas.
Os politicos italianos e brasilianos deviam ser considerados como o oregano na pizza marguerita...
Abraços
Oi Allan
Essa política "me dá nos nervos"! Não aguento mais assistir ao telejornal, pois é sempre a mesma coisa!
O que mudou até agora se esse governo continua "de pé" mesmo tendo uma lei inconstitucional? Gostaria de saber as respostas das tuas perguntas, pois aja imaginação da minha parte para tentar compreender toda essa sujeira!
Hehehehe, no final das contas tudo acabou mesmo em pizza (sem orégano)!
Quanto ao teu comentário lá no blog, o queijo de minas curado que eu trouxe no mês passado do Brasil já acabou, então na próxima vez que fizer biscoito ou pão de queijo vou usar o pecorino romano para experimentar! Adorei a dica!
Léia
Oi, Allan!
Do lado de cá do Atlântico, sabíamos que a política italiana estava cheia de erros... Mas quem tinha de corrigir os erros não o fazia antes por quê?
Na época da aprovação da lei, Berlusconi foi o grande beneficiário que elege 75% dos deputados por método maioritário, com os restantes escolhidos por contagem proporcional. É uma lei que possibilita a formação de Governos estáveis, o que fez o dito bater todos os recordes de longevidade. Corrija-me se estiver errada!!
Tomara que mude para melhor - eu não gosto de misturar manjericão com orégano - um ou outro, per favore!!
Beijus,
Que salada. Até parece um certo país de que ja ouvi falar...
uma nova lei eleitoral é a coisa mais importante nesse momento na Itália. Todo o mundo sabe disso e ninguém faz o primeiro passo, vamos torcer porque isso aconteça logo com a nova eleição de Renzi (o novo secretario do partido de esquerda).
Allan falou muito bem de como funciona o sistema eleitoral, acho que ele é um dos três que fizeram o pacto :)
sobre o resto: o orégano na pizza margherita é uma porcaria (tipo porcellum :) )
parola di italiano del sud
Esses dias chegou umas cartas falando pra cadastrar no fórum eleitoral pra votar... mas eu confesso que nem no Brasil eu tinha vontade, fazia por obrigação e agora é só justificativa...
Não gosto de participar.
Kisu!
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