Gosto muito de animais. Muita gente estranha essa afirmação quando descobre que não possuo nenhum animal em casa. Nessas horas é difícil convencer que “gostar”, nesse caso, significa, também, respeitar. Moramos em apartamento e estamos fora o dia inteiro. Jamais deixaria um animal de estimação (vem de estimar = ter afeição) trancado dentro de casa o dia inteiro justamente por gostar dele. Não o deixaria mesmo se não gostasse, o que deveria estar implícito no meu texto, mas como a eloquência é uma qualidade que ainda não conquistei, deixo registrado.
Essa relação de suposta superioridade entre seres humanos e os outros animais sempre me incomodou. Um dos pontos do problema se evidencia nesse período de início das férias na Europa. Começa agora a campanha contra o abandono de animais domésticos, uma praxe do verão italiano, quando milhares – milhares! – de animais são largados à própria sorte ou ao socorro de voluntários e samaritanos. Nada parece surtir efeito aos que adquirem um animal como quem compra um brinquedo, que será jogado fora não por estar quebrado, mas porque a meta das férias não aceita animais, ou o transporte é complicado, ou simplesmente porque o filho já não dá atenção ao velho brinquedo.
Nos últimos dez anos minhas filhas viveram sem um cão, um gato ou outro animal em casa. Sim, tem sempre o pai delas que morde, late e se coça como um cão, e que transmite a elas os ensinamentos adquiridos com os cães, mas não é a mesma coisa. Ah, tem as formigas, é claro, mas essas também não contam. Viver sem a companhia de um cão é, para mim, um sacrifício; mas creio que seria um sacrifício maior saber que há um cão trancado em casa. Não entendo como alguém possa ter a coragem de abandonar um animal na rua para viajar nas férias. E não são somente cães e gatos, não. Nessa época os lagos e chafarizes das cidades sofrem com a superpopulação de peixes de aquário, tartarugas, iguanas e outros répteis. Os mesmos lagos e chafarizes que estarão congelados no Inverno.
Não. Prefiro viver sem a alegria de um cão que deixá-lo trancado ou ter que me desfazer dele, como um eletrodoméstico quebrado. Vou aproveitando os momentos que os animais soltos me proporcionam, como o Caruso, um melro que mora no telhado do convento nos fundos de casa. Não lhe dou alpiste ou migalhas de pão; não deixo água no balcão da cozinha para matar a sede dele; não limpo o poleiro e sequer passo o dedo na cabecinha dele. No entanto, ele canta todas as manhãs, pouco antes do sol nascer (4, 4 e meia da manhã) e vai em frente até por volta do meio dia. Só pára quando começa o verão. Sem gaiolas, aquários, correntes ou portas fechadas. Somos felizes assim.
13 comments:
Perfeito.
Allan, te entendo perfeitamente. Tivemos 2 porquinhos da india, mas eu estava sempre reclamando que eles passavam mais horas dentro da gaiola do que fora dela por causa do inverno longo por aqui.
Eles morreram; e fui firme em dizer que nao quero mais nenhum bicho em casa; quem ficava triste era eu e nao eles...
Bom fim de semana
E pensar que existem pessoas que chegam a fazer operação de cordas vocais em seus cães para que os mesmos não possam mais latir em seus apartamentos...Muita crueldade.
Animais, mas que devem ser tratados como seres vivos.
Buon Sabato!:)
Agradecerei aos Deusas por sua sensatez e ficarei aqui a esperar que ela seja altamente contagiosa. Não aguento mais (confesso) ver cães e gatos serem abandonados como se fossem objetos descartáveis. Não aguento ve-los pelas ruas, solitários, com aquele olhar pedindo para ser levado para casa. Tenho um cão (teoricamente não tenho filhos) porque de certa forma ele é um filho... Bjs
Vc vai pro céu! Já está do lado do papa mesmo! Quer dizer que os italianos fazem isso? Aqui no Brasil, as pessoas deixam trancados em casa mesmo! Imagine no calor do Rio, um cãozinho trancado num apartamento.
Essa é a razão principal de eu ainda não ter um cão.
Aqui no Rio tem gente que ainda extende esse comportamento possessivo e egoísta às relações humanas. Amam no inverno e "desamam"(sic) quando se aproxima o carnaval.
Mas isso é assunto para um post, né?
abração e ótima semana
Aqui no Brasil, pais irresponsáveis adquirem animais em pets como se fossem brinquedinhos pra seus pirralhos, passada a novidade ou o bichinho apresentar qualquer problema de saúde é lançado sem dó para fora de casa. A prefeitura recolhe os bichos e passado um tempo, sem que haja adoção, eles são executados. Pecado!
Oi Allan, tudo bem com você? Estou visitando os blogs amigos e me deparei com esse post maravilhoso seu. Eu tenho um cãozinho que é o meu xodó e ele só fica sozinho quando saímos para fazer uma coisa qualquer. Deixar o neném o dia inteiro sem ninguém? Nem morta.
Beijocas
Yvonne Dimanche
Oi Allan.
Me lembro que quando eu morava aí na Italia, no verão eles colocavam uma propaganda na TV para conscientizar as pessoas sobre o abandono dos bichinhos.
Pelo jeito parace que não adiantou muito ...
Bjs.
Elvira
Ah! Já assisti o filme e li o livro também ...
Ciao Allan! Caríssimo, belo post. Reproduziu meus pensamentos! Adoro animais e os respeito. Por isso não tenho nenhum no meu quarto-sala onde vivo aqui a Torino.
Me embrulha o estômago só de pensar que meu vizinho do lado tem uma tartaruga dentro de uma minúscula vasilha com água no balcão do apartamento. Qual sentido faz manter aquele animal ali? Não consigo entender! Ah se eu pudesse...
Inté.
Oi, Allan
Vc viu meu outro blog? É sobre o problema dos animais abandonados....(também)
www.educarparadiversidade.blogspot.com
É uma vergonha que pessoas abandonem seres sencientes como se fossem coisas. Aliás, acho que essa forma de "simplificar" a vida não fica só nos animais, não. Quem faz isso, age assim com tudo, com todos....não serve mais, joga fora...
Precisamos de uma mudança na metalidade mundial urgente!
Abraço! Rosa
Eujá tive um melro que nos adotou, era a maior figura, um dia resolveu ir embora. Eu e minha irma ficamos tristes... mas do jeito que veio, foi. E deixou saudades das brincadeiras. Ele vivia solto.
Eu lembro dos sabiás e bem-te-vis que tinha lá em São Paulo. Toda tarde de final de inverno e começo da primavera eles estavam lá nas árvores (eu tinha sorte de morar cercada de verde na cidade mais cimentada do Brasil) cantando. Aqui na Itália, o melro me faz relembrar dos tempos que ouvia o sabiá laranjeira cantando em São Paulo.
Há dois anos, em julho mais ou menos, vi um cachorro latindo desesperado perto do nosso condomínio. Era de raça, marrom, com pelo baixo e olhos azuis bem claro (não sei o nome da raça). Via-se bem que era criado em casa e parecia ter sido abandonado. Como tenho gato aqui em casa, nem acolhi o pobre cãozinho. Meus vizinhos de casa deram comida para ele e o levaram ao veterinário que, graças ao chip incorporado, conseguiram localizar os donos. Quando o cachorro foi devolvido, os donos disseram que ele havia se afastado e sumido (o que é muito difícil até um gato fazer isso, imagina um cachorro). Mas ninguém me tira da cabeça que foi mais uma tentativa de abandono de animais.
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