Thursday, July 13, 2006

Vizinhas

A velhice é aquela fase da vida que todos esperam alcançar, mas que todo mundo reclama quando chega.

A vizinha da porta ao lado é uma senhora muito rica, na faixa dos oitenta anos; daquelas que tomam um copo de suco de de mico todas as manhãs e não sossegam o dia inteiro. Parte da famíliafilha, genro e netas – moram no quinto andar. Muito simpática, perguntou quantas horas de viagem são necessárias entre Piacenza e o Brasil. Ao ouvir “doze horas”, assustou-se e perguntou como as meninas aguentariam passar tanto tempo dentro do carro. Acho que ela andou matando aulas de geografia enquanto estudava como ficar rica.

A vizinha do terceiro andar é a típica vizinha que existe no cinema: pouco mais nova que a primeira, solteira, sem parentes, rica e rabugenta; daquelas que encontram na discussão o único modo de comunicar-se. Fala de tudo e de todos. Lamentou que o elevador funcionava mal; mandaram consertar e ela reclamou que interditaram o elevador para consertar. Encontrei-a chorando por ter que levar as compras escada acima. Prontamente tomei-lhe os sacos do supermercado e levei-os até a porta do apartamento dela. Ela subiu resmungando e me aconselhou a não envelhecer, que a velhice é um castigo… Lembrei a ela que a única alternativa à velhice atrai poucos adeptos.

Esta manhã ela se indignava:

– A gente sabe que o verão chegou quando todo mundo sai de férias. O carteiro não passadez dias.

15 comments:

I said...

"viver muito tempo é um dom de Deus, mas é preciso pagar um preço demasiado grande " Esta frase retirei-a de um dialogo , num dos filmes de Manoel de Oliveira, "viagem ao principio do tempo" e parece-me que ilustra a realidade.Recordo a minha avó paterna que morreu com 100 anos, 1 mês e 1 dia, plena das suas faculdades mentais (lia, conversava coerentemente e fazia crochet) dizer: "penso por vezes que viver demasiado tempo tem algo de perverso: as minhas amigas morreram todas; agora restam-me para conversar as suas filhas de quem fui professora e que, por isso, malgrado o tempo ter decorrido, mantêem em relação a mim, algum do distanciamento que obrigatoriamente tinham que ter quando eu era sua mestra.".Por outro lado ha vantagens e essas são sentidas sobretudo pelos "novos" velhos, ou seja , por uma nova geração de idosos , muito diferente das gerações passadas: devido ao aumento da esperança de vida, os velhos de agora são tendencialmente mais cultos, têem outras motivações, outros interesses e gozam de uma maneira geral, de maior bem estar fisico , pois as condições de vida melhoraram.A esses, refere-se Agostina Bessa Luis, chamando-lhes "a Flor do Sal".E são mesmo.Um dos prazeres grandes da vida é conversar com pessoas que são cultas e inteligentes, velhas , cheias de experiência e grande sabedoria.

Claro que essas vizinhas rabugentas...são manobras de diversão.

um beijinho, isabel

Anonymous said...
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Paulo Nunes Jr said...

Allan,

A população de velhos aqui na Itália é muito alta! Tá pra mais de 25% da população, isso só de aposentados. Eu vivo comentando que sempre que passo por um parque que temos aqui perto de casa a maioria das pessoas que estão lá são velhos! Quase não se vêem crianças. Aqui no meu prédio eu só vi uns poucos adolescentes e uma única jovem de uns 22 anos.

Se você analisar vai ver que jovem aqui não tem muito espaço. Nas universidades são no máximo assistentes puxa-sacos dos professores que servem pra fazer o trabalho no computador que eles não sabem. Na política é a maioria deles, inclusive o presidente que tem quase 90 anos. Na direção da maioria das empresas eu vi poucas vezes executivos jovens. Jovem empreendedor então...
Claro que é precisao valorizar e respeitar a 3.a idade, mas um país não pode estar na vanguarda sem que se promova novos talentos.

Se os extracomunitários não fizerem filhos não sei o que vai ser da população italiana! haha

Abraços.

Anonymous said...

adorei o post. muito bem escrito, como sempre. envelhecer com sabedoria é para poucos.
beijos

Anonymous said...

sabe, Allan, eu tenho uma teoria (na realidade, divirto-me fazendo teorias..) de que a bebida e a velhice não alteram substancialmente nada, só potencializam. Assim, o velho rabujento foi um moço rabujento, numa escala mais light. O bêbado incomodativo quando sóbrio também não é lá essas coisas.. Meu remédio pra minha velhice (que anda a passos mais largos do que eu desejaria) é manter o bom humor. Rir muito. Principalmente de mim mesma!!

Lilica said...

Eu acho que o Allan só tem vizinhos ricos pq é rico também. Tenho desconfianças que ele e o Flávio estão na Máfia...Inclusive com braços na Máfia chinesa. Lembram das fotos dos dois no meio de um coral de chineses?

Beijinhos, estava com saudades dos seus textos lindos!

Julio Cesar Corrêa said...

Allan,
chguei até aqui através do Rafa Galvão. Gostei da sua crônica. A velhice é mais ou menos igual em todo mundo. Mas deve-se sentir num continente envelhecido.
boas pizzas pra ti
gd ab

Lucia Malla said...

Allan, as vezes me pego pensando: serah q quando envelhecer serei assim tbm? Serah q essas mulheres sempre foram assim? Misterios da vida...
Beijos.

Anonymous said...

Allan, eu penso que ninguém fica rabujento só porque envelheceu. As pessoas quando ficam mais velhas vão perdendo uma série de amarras. Isso serve tanto para as coisas boas como também para as ruins. Minha avó quando teve derrame e ficou meio gagá, se tornou uma pessoa maravilhosa porque se desvencilhou de um monte de coisas que a tornava chata. Essas suas vizinhas estão sendo apenas o que elas sempre foram quando jovens e que talvez não colocassem para fora. Beijocas

Anonymous said...

Eu ando percebendo que ficar velho é algo que vai acontecendo aos poucos, mas fica dentro da gente. A cada cinco anos sai e desabrocha bem no momento que voce acorda e olha pro espelho do banheiro. Aqui em casa já destrui todos os espelhos dos banheiros.

Julio Cesar Corrêa said...

Valeu por ter levado bala
gd ab

Leila Silva said...

Allan,
Essa resposta sobre a alternativa à velhice foi ótima.
Abraços

Santa Panela said...

Esse seu post foi "SODA"... Tô me vendo velhinha e rabuja!!!!

Claudio Costa said...

Allan,
quando eu era criança/
queria ter muito tempo de vida/
agora constato/
perplexo/
que quanto mais tempo de vida tenho/
menos tempo de vida terei.

Ou, como dizia a avó da Amélia, minha mulher: 'caminhantes somos, pelos mesmos caminhos passamos'.

Ou, ainda, como diz o trocador do ônibus, lotado:
- um passinho à frente que atrás vem gente.

"E a fila anda... eu é que não quero furá-la!".

JM said...

Talvez você possa me responder: por que o uniforme da Itália é azul, e a seleção é conhecida como Azzurra, se as cores da bandeira italiana são verde, branca e vermelha?