Caros e Caras,
Paz e saúde!
Um famoso filme italiano intitulado “Ladrões de Bicicleta”, de Vittorio de Sica, só faz sentido depois de conhecer a Itália. Aqui todo mundo anda de bicicleta.
Nos dias frescos de primavera, início e fim de verão e no outono, eu prefiro ir trabalhar de bicicleta. As outras pessoas, também. Em casa somos em quatro e quatro são as nossas bicicletas. Isso porque demos uma usada de presente. Mesmo no inverno, muita gente prefere a bicicleta. É sinônimo de saúde e é elegante, além de ecológico e econômico.
Senhoras de casacos de pele, advogados em ternos Armani, a mãe que leva a criança para a escola, o pedreiro, a vizinha gorda indo às compras, pessoas que passeiam com cachorros, o passeio dominical da família. Todos, pobres ou ricos, bem vestidos ou menos, a passeio ou a negócios, com ou sem guarda-chuva, vão de bicicleta.
Nomes como Marco Pantani, Mario Cipollini ou o legendário Gino Bartali são tão conhecidos aqui como os nossos Oscar Schimidt, Gustavo Kuerten ou o legendário Ayrton Senna. O ciclismo é o segundo esporte da Itália, só perdendo para o futebol, apesar da bola ter muito menos praticantes que a bicicleta. Giro d’Italia, Vuelta d’España e Tour de France são algumas das competições que aquecem a crônica esportiva no verão europeu.
Os centros históricos não podem ser demolidos nem modificados (algumas casas são reestruturadas por dentro e podem ser restauradas por fora, desde que mantenham à vista a estrutura e as telhas originais – na medida do possível, é claro) e, portanto, possuem as mesmas ruas estreitas da época em que foram projetadas para serem transitadas por pacatas carruagens. A maioria das antigas casas não possui garagem e estacionamento é uma necessidade que surgiu depois do excesso de veículos. Resumo: não há onde estacionar! Ou se vai de bicicleta, ou alguém terá de dar voltas no quarteirão enquanto a mulher vai no cabeleireiro. E reze para o salão estar vazio.
No inverno, em frente às estações de trem (toda cidade tem uma), as bicicletas acorrentadas umas às outras, nos postes, placas de trânsito, ou simplesmente a si próprias, transformam a paisagem em algo surreal depois da primeira neve. Um manto branco cobre a praça, congela o chafariz e transforma as bicicletas em esculturas de gelo, brancas e imóveis, como em uma cena arqueológica.
Um rapaz argelino, que trabalhava num supermercado vizinho, aparecia sempre com uma bicicleta e uma estória diferente. A sua havia quebrado e o vizinho emprestara a dele; a namorada pediu para levar a dela para o conserto; não pôde recusar uma pechincha…
Sobre o filme do primeiro parágrafo, me recordo que o protagonista decide roubar uma bicicleta, depois que alguém roubara a sua. E ele, pobre, dependente dela para trabalhar e tocar sua vida, sem dinheiro para repor aquela que fora furtada, manda o filho ir para casa. Mas o pequeno intui tudo e segue o pai, terminando por salvá-lo, quando passantes frustram a sua tentativa de roubo e se comovem com o menino que chora em silêncio pelo miserável que acabam de prender. Decidem soltá-lo e o mandam à casa.
Se nos dias de hoje o argelino do supermercado me faz lembrar de acorrentar minha bicicleta a um poste e que já não há espaço para romantismos, por outro lado posso assegurar que a bicicleta continua sendo a paixão nada secreta de todo italiano.
Um conselho útil: Se tiver a oportunidade, nunca, jamais tente andar de bicicleta sobre a neve.
Ciao.
5 comments:
Oi, Allan!
Que legal o teu blog! Bom ler histórias da Itália, país que tanto me fascina, e que espero ter um dia a chance de conhecer.
Tento imaginar a cena das inúmeras bicicletas circulando pela cidade, e tudo isso tem um ar poético, com jeito de que o tempo esqueceu de passar...
Um abraço, e obrigada pela visita!
Ninha - http://www.doislados.blogger.com.br
Ciao!
Buon Giorno!
Mia madre e di Modena e mio padre di Reggio Emiglia.
Mas eu sou brasileira mesmo...a única da família. Moro no Rio e sou amiga do Márcio do Pão com Azeite. Seu comentário lá deixado me fez vir aqui.
Essa elegância a qual você se refere só pode ser visualizada por quem já morou ou já passou um tempo por aí...
E as bicicletas italianas são as melhores do mundo...
Quem me dera...
Tanti saluti.
Cris
http://viscerais.blogger.com.br
Lindo!
Fiquei apaixonado pelo teu blog. Ele me fez viajar mesmo sem apresentar nenhumna imagem. Minha mulher é italiana e se emocionou ao ler todos os teus posts. E eu passei a entender um pouco mais da terra natal dela. Beijos de nó dois.
Frank & Gaia
Allan,
O filme em questão é um clássico do cinema universal e realmente é muito bonito. Sei que na Europa se valoriza muito o hábito da bicicleta (coisa impensável no nosso Brasil) e você pôde observar bem - com o olho clínico de todo bom escritor - e, quem sabe, nos ensinar que ainda é possível viver com charme, mesmo nesses nossos dias.
J.I. Loyola - loyola@hotmail.com
ler todo o blog, muito bom
Post a Comment