Dia 5 de maio ele aparece em casa com umas garrafas de vinho, algumas pizzas e a Benedita fiel. Era o aniversário dele e bebemos até ele ficar bêbado.
Certa
vez, uma bronquite deixou ele internado no hospital por uns tempos. Passado os
primeiros dias, tudo era cotidiano. O paciente da cama ao lado tinha um exame
delicado programado. A enfermeira deu o purgante a ele no início da tarde e
sumiu. Ninguém apareceu para orientá-lo e, na hora da janta, o cidadão
recuperou o que lhe haviam evacuado, por assim dizer. Na manhã seguinte, o
médico entrou para examiná-lo e estranhou o volume no abdômen. O vivente (ainda
era um vivente, mas prestes a deixar de sê-lo) contou que não sabendo que teria
que ficar tanto tempo em jejum, tinha enchido o bucho na noite anterior. O
médico se desculpou pelo lapso e avisou ao paciente que mandaria repetir o
purgante, e que depois do purgante ele não deveria ingerir nada de sólido.
Naquele dia ninguém apareceu com o purgante e o moribundo lambeu a bandeja. Dia
seguinte, o médico apareceu e descobriu o novo “lapso”. Chamou a enfermeira,
que disse ter dado o purgante “anteontem” e imaginava que já tivessem operado o
paciente – que, àquela hora, já nem conseguia falar. O médico pediu, então, ao
Stefano que ele controlasse que a medicação fosse ministrada e que lembrasse a
ele – o médico – do exame no dia seguinte, que àquela altura era de urgência.
“Se ele estiver vivo ainda, né doutor?”
Todas
as noites um outro paciente se vestia, colocava o capote, por cima do capote, a
camisola e saía do quarto por uma hora, uma hora e meia. Todas as manhãs o
médico vinha com uma equipe avaliar a evolução do quadro clínico (deveria ser
alguém importante, com tantos médicos em volta). Resmungavam que os níveis
ainda não eram aceitáveis, discutiam se aumentar as doses dos remédios ou usar
outras terapias, anotavam tudo e saíam. À noite, lá ia o paciente de novo dar a
voltinha dele. O ritual de sempre ao se agasalhar bem e colocar a camisola por
cima. “Faz muito frio lá na máquina de café do andar de baixo?”, perguntou
Stefano. O cidadão reagiu freneticamente, como se tivesse tomado um choque, com
o indicador diante da boca e um longo “psiu!”. A meia voz, contou que ele ia
jantar na trattoria do outro lado da rua, que fazia uma tripa dos deuses.
“Segredo absoluto”, pediu. Na manhã seguinte os médicos descobriram que o
estado do paciente piorava e não sabiam o que fazer. “Experimentem fechar a
tratoria”, pensou Stefano.
Depois
de tanto vinho (o dele e o nosso), lá foi a Bene pilotando a macchina. Melhor evitar hospitais.
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15 comments:
Conto surpreendente! Gostei do estilo...
É... Um bom vinho e alguma massa podem render belos contos. Eu tenho alguns de hospital, mas os meus são mais tristes... Gostei do Stefano!
Sempre me surpreendendo com seu estilo envolvente. Muito bom!
Abraço, garoto
São histórias reais? Adorei.
Não entendo de vinho, mas deve ser muito bom acompanhando a história.
Kisu!
Adorei, um bom vinho e a mente sã, curam os males!
Oi, Allan!
Melhor evitar! Mas pelo menos, seu amigo saiu vivo!
Beijus,
Bom dia Allan!
Coitado! Purgante em dose dupla, fome, vizinho de cama saindo para comer tripa - será que ele também não errou de hospital e foi parar num manicômio?! Hehehehe!
Bjim
Léia
Oi!! Preciso de duas informações importantes:
1 - Onde é o hospital, para que eu não vá!!
2 - onde é a Trattoria? Adoro Trippa!!!!
hahahaha
Bjs, adorei o texto
Allan,
que pacientes mais danados, heim?!
a historia de hospital me fez lembrar de uma empregada minha que depois de esperar 12 horas pelo atendimento na emergencia do Miguel Couto, fugiu carregando nos braços o travesseiro dela!
bjs
ha ha ha... hospitais, hospitais, eu também prefiro a tratoria.
Bom final de semana amigo!
:) como sempre otimo, e sim, evitar hospitais...principalmente os de aqui ondeestou!!!
abraco
P>SAllan nao venho taao seguido pqe nao me sinto mto bem, muitomuito cansada....
Ri um bocado, muito bom!
Em estilo completamente diferente, Graciliano escreveu excelentes contos a partir de suas observações quando esteve hospitalizado.
Manoel Carlos
Estilo envolvente mesmo! Enquanto lia, fiquei imaginando como se estivesse vendo um filme.
Achei muito engraçado. Dá até pra imaginar a situação. Parabéns. Enviei um e-mail para o senhor no gmail. Um abraço.
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