Caros e Caras,
Paz e saúde!
Demorou, mas acabei me dando conta da besteira que fiz. Estou no lugar errado, eu jamais deveria ter vindo morar na Itália.
Nos Carnavais em Salvador, gostava de ir para a praça Castro Alves, o coração do inferno. Ver os Filhos de Gandhi descendo em direção à praça ou sentir o estômago vibrando com os acordes dos trios elétricos é uma experiência inesquecível. Voltando para casa, acendia um abatjour e deixava a música num volume baixo. Gosto de festa, mas gosto também de paz.
Às vezes tenho a impressão de que na Itália a festa não acaba nunca, apenas dá uma pausa à noite, para recomeçar com toda força na manhã seguinte. Faz parte da cultura local falar num tom de voz muitos decibéis a mais do que o meu ouvido considera aceitável. Mas esse é um problema meu, sou eu que estou deslocado.
É fácil localizar minha casa à noite: ela serve de ponto de referência por ser a mais iluminada. Todas as luzes estarão acesas ao mesmo tempo, mesmo quando minhas três meninas estão juntas em um único cômodo. Sinto-me um homem de muita sorte por possuirmos dois aparelhos de TV em casa. Se possuíssemos cinco, tenho certeza de que dariam um jeito de ligar todos ao mesmo tempo. E no volume mais alto. A primeira coisa que faço ao voltar do trabalho é apagar as luzes e diminuir o volume da TV. Só depois consigo sorrir e beijar a patroa e nossas duas princesas. Procuro não me irritar, pois adoro a algazarra das meninas. O problema é querer ouvir Bach nesta casa ou neste país.
A rainha da TV italiana é uma loira arrogante e esganiçada, imitada aos berros em todos os canais e programas. As pessoas caminham pela rua falando ao celular num volume tão alto que o aparelho se torna desnecessário. Os gritos da vizinha nem sempre significam briga: pode ser apenas uma troca de receitas. O motorista de táxi, o barbeiro, a senhora gentil da quitanda, o vendedor da loja de sofás, todos têm o que eu chamo de “síndrome do Sole Mio”. E se você não entendeu, experimente cantar o Sole Mio sem gritar. A vantagem é que não existem segredos nessa terra.
Buzinar não é comum, mas as viaturas de polícia, os carros de bombeiros e as ambulâncias mantêm as sirenes ligadas mesmo às quatro da manhã. Depois, tem o caminhão de lixo, os veículos varredores de rua e os topolinos (micro-camionetes de três rodas) que recolhem vidros nos latões de coleta diferenciada. Todos passam à noite e cada um tem um rumor característico. Minha insônia é testemunha. Nem consigo sentir tanta saudade da Timbalada ou do Olodum.
E durma com um barulho desse.
Ciao.
Estamos tão acostumados com "a gritaria" que é o nosso dia-a-dia que, quando temos um momento de silêncio, de calma, parece o mundo parou, está em suspenso, aguardando que nossos pensamentos nos leve a algum lugar.
ReplyDeletePor isso sentimos tanta falta dos silêncios.
abraço
Allan, sou mais uma brasileira aqui na Italia e tomei a liberdade de seguir o teu blog. Essa questão do barulho é uma grande verdade, não consigo suportar numa altura normal o som que a TV emite...Outro dia estava assitindo a um program na TV e minha sogra comentou comigo: "Nossa, mas como esta apresentadora tem a voz doce." E na verdade é porque ela falava num tom de voz baixo e de forma calma sem falar por cima de outra pessoa que ja esta falando. Esta é uma mania nacional e infelizmente muito difundida aqui...
ReplyDeleteUm grande abraço
Ana
Oi Allan,
ReplyDeleteEhe...os italianos sao tremendos, esse seu comentario me fez recordar quando pegava o trem Lyon-Turim. Enquanto estavamos na França, nao se escutava nenhum barulho(de celular), bastava chegar a Modane, Bardonecchia, começava o INFERNO. A gente conseguia saber da vida de todo mundo, e olha que era uma telefonada so pra informar que a pessoa estava chegando e que esperava que alguèm viesse a apanha-la na estaçao. Eu, convivo com um dj, e voce pode imaginar... depois que ele acorda atè as 03:00 da manha com raras pausas, passo por todo tipo de musica... o pior è que nao sao escutadas atè o final, e isso faz "montar" uma irritaçao que nemte conto, mas...como ele tem suas qualidades, acabo me organizando e vou estudar na biblioteca(que fica a 25km). Os italianos, os rapazes norte africanos, sao uma caixa de som AMBULANTE. Infelizmente, è assim... o negocio e colocar um bom par de "cuffie" para nadador e navegar nas aguas da bota... altrimenti... impazirai.
Um abraço e... BUON ASCOLTO caro :-D
Sei bem o que está dizendo e sofrendo...lá em Carajás eu sofria com o "brega", sempre escutado muito alto por todos os vizinhos ao redor. Aqui em Tefé tem um clube bemmmmmmmmm do lado da minha casa. No fim de semana eles colocam a música tão alta, mas tão alta que as janelas tremem!
ReplyDeleteAgradeço ao inventor do ar condicionado...que eu ligo no talo, tranco a porta e durmo (com a TV ligada quase sem som!).
Beijos
Adorei o seu post! Tinha a mesma sensação quando morava em Roma.
ReplyDeleteE quanto ao carnaval de Salvador, sou meio suspeita, mas adoro!!! A única coisa chata é que cada ano que passa os trios vão ficando mais "pasteurizados", mas ainda é uma delícia!!! Bjo.
Allan, otimo seu post! Essa foi uma das primeiras coisas que mi irritaram aqui...No Brasil(Belo Horizonte) morava em um bairro super calmo, arborizado, so se ouvia o canto dos passaros... Aqui na Italia moro em Torino e nao consegui ainda ter uma noite de sono sem acordar varias vezes...e daqui a pouco termina o frio e os italianos começam a dirigir aquelas LAMBRETAS insuportaveis de barulhentas hehehe ai ai vai ser dificil dormir...Outra coisa: Nao consegui ver ainda na Italia algum programa de entrevistas com uma conversa civilizada entre os participantes...hehe sempre bate-boca, gritaria e todos falando ao mesmo tempo! Enfim, é mesmo cultural e a normalidade que eles nao se dao conta.
ReplyDeleteAllan, sei bem o que é isso. Sou casada com um italiano que no começo do namoro me aterrorizava com o tom de voz. Eu sempre achava que era briga... Em compensação, aqui em Sampa temos esses "sei lá o que diga", rapazes e outros nem tanto, que gostam de botar o volume do carro no máximo. Isso somado às buzinas e ao engarrafamento constante, deixa qualquer um louco. Acho que ou nós ficamos surdos de vez ou nos mudamos para a Sibéria..( urso faz barulho?)
ReplyDeletebeijão
Apesar de mamãe ter me ensinado a não rir da desgraça alheia, dei boas gargalhadas com seu texto.
ReplyDeleteAqui no Rio de Janeiro os motoristas têm a síndrome da mão nervosa. Basta o sinal pensar em ficar verde que eles já tacam a mão na buzina. É uma falta de civilidade a toda prova.
Allan, fique longe da Espanha. As pessoas não conversam em tom dito normal. Elas gritam. E não é porque estão discutindo. Simplesmente é um sinal de que a conversa está animada. Se a gente escuta em silêncio o que eles dizem, espera a outra pessoa acabar de falar pra então argumentar, passa por mal-educada.
ReplyDeletePara mim, você acaba de descrever o inferno!Depois das fotos lindas que V. mostrou, do seu passeio de bicicleta, das receitas que dão vontade de cair dentro de todos os prazeres, este post que me fez cair na real. Sempre penso que conseguiria resistir bem à tortura, dor física, ameaças, tudo bem, mas à voz alta, insistente, à música alta, à tv o dia todo...não resisto, sou capaz de denunciar até a mãe, revelo todos os segredos, acuso, e até invento novos se for preciso.
ReplyDeleteSò pra citar...qdo chegeui aqui, estava no escritorio da empresa do meu marido conversando com a secretaria, quando ouvi que meu amrido e meu cunnhado falavam ou melhor gritavam, em dialeto, eu comecei a tremer, com medo, atè a secretaria me explicar que eles nao estavam brigando...
ReplyDeleteAllan,
ReplyDeletePois você só acabou de me convencer que os brasileiros e italianos têm muita coisa em comum. Barulho é o que não falta neste país...Fiquei dez anos longe daqui, vindo por um mês ao ano, ou 15 dias a cada seis meses.Quando, no ano passado, decidi ficar aqui mais tempo fiquei muitas noites sem dormir por causa do barulho. Não, os italianos não podem ser melhores nisso, no máximo iguais.
Abraços
Leila
Fiquei intrigada com a pergunta do Flavio Prada. Consigo imaginar uma ou duas respostas, mas ele bem podia nos contar.
ReplyDeleteHahaha... Eu nem me atreveria a responder a pergunta do Flavio. Eu entendo perfeitamente essa agonia em relação à gritaria, aqui em casa eu sou a única "ET" que fala baixo e não suporta berros. Nas reuniões de domingo é aquela gritaria absurda, minha avó é a rainha dos berros mas meu padrinho falando parece que está prestes a matar alguém de ira.
ReplyDeleteAmico, se quiser mudar o layout e precisar de uma ajudinha... Me fala! Eu faço pra você. O do meu site é mais complicado porque é em PHP, mas os layouts do Blogger não são difíceis de fazer. Sério, se quiser me avise. Bacio!
Em busca de atualização, deixo abraço.Bom fim-de-semana!
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