Sunday, November 07, 2004

Essa Tal Tecnologia

Caros e Caras,
Paz e saúde!

Numa troca de e-mails com o Rafael, citei o livro “Zen e a Arte de Manutenção de Motocicletas”, do Robert M. Pirsig. Um daqueles livros que passavam de mão em mão na minha adolescência. Nele, alguns personagens se precaviam: “Ele sabe lidar com aquilo…”. “Aquilo” era a tecnologia da época. O livro vale apenas por essa citação. Se você não o leu, não perca tempo. Mas pode presenteá-lo ao seu sobrinho.

Às vezes me identifico com aqueles personagens, avaliando o quanto nos distanciamos da palavra animal para sermos cada vez mais próximos da outra: racional. Não, não será um papo natureba, incentivando a andar nus e a só comer verduras cruas. É mais um cair de ombros impotente. Além da constatação da minha dificuldade em lidar com tudo que tenha mais de seis botões (play, ff, rwd, stop, eject e on-off) ou possua conceitos abstratos. Tenho plena capacidade de compreender e avaliar conceitos concretos: um prato de feijoada é um prato de feijoada! Corolário: em dez minutos será um prato vazio. Taí um conceito do qual me orgulho em compreender como poucos! O curioso é que decidi estudar Economia, argumento abstrato que sempre me fascinou.

A Província de Milão espalhou milhares de câmeras em locais sob risco. Semáforos, bancos, consulados, prédios públicos e mais um monte de outros pontos de vigilância observando vinte e quatro horas por dia. Quem os controla? Como se não bastasse a sensação no cangote de estar sendo observado, a moda esquizofrênica big-brothiana foi parar no satélite: a partir do próximo ano, a mesma província estará medindo o volume de tráfego em tempo real, através da movimentação dos celulares. Mesmo os celulares desligados são captados e servirão para informar o fluxo de veículos em qualquer horário. Informações que serão fornecidas aos próprios usuários por preços realmente módicos. Então, tá!

Na versão italiana da revista Sport Week da semana passada, o esquiador Emilio Previtali dá algumas informações sobre o seu projeto de descer o Himalaia em snowboard. Com uma pequena mochila para acomodar alguns apetrechos tecnológicos que possibilitarão transmitir trechos da descida, espera atrair os tão necessários patrocinadores. Prancha de snowboard leve (menos de um quilo) e adaptada a qualquer tipo de neve; corda de kevlar de sete milímetros de diâmetro; Arva system, um instrumento que permite localizá-lo caso seja soterrado por alguma avalanche; telefone celular satelitário, com conexão a 19.6 bps; palm top para gerenciar a navegação via web e para descarregar imagens e vídeos; máquina fotográfica digital de 5 megapixel, capaz de registrar não somente fotos, mas filmes e voz. Tudo isso interligado para possibilitar transmissões ao vivo, com alimentação através de um painel solar e pesando menos de um quilo. Não sei se a aventura me impressiona mais que o equipamento.

Depois dos localizadores para automóveis, que permitem acompanhar a movimentação de caminhões, mas que não impedem o furto de cargas, chegou o tempo de localizadores de pessoas, com micro chips implantados sob a pele. Mas esses também são incapazes de livrar seus portadores da violência. No país da pizza margherita são os cães que utilizam micro chips implantados sob a pele, com um código de barras (outra tecnologia enraizada no nosso quotidiano) contendo todas as informações sobre a origem e propriedade do animal. O que também não evita que eles sejam abandonados pelos seus donos no início do verão. Outro micro chip: o que transmite sinais nervosos diretamente do cérebro e permite a paraplégicos pequenas ações, numa espécie de telepatia on-line, tecnologia weireless. Um amigo perguntou se poderá substituir o viagra.

Todas as grandes lojas distribuem cartões fidelidade, que oferecem descontos e ofertas exclusivas. Não somente para estimular o consumidor a concentrar suas compras, mas, também, para montar o perfil padrão da clientela e enviar malas diretas, além de vender os dados cadastrais a terceiros. Um maluco da cidade (dizem que é maluco, eu ainda estou na fase de observação) vive sem dados: Tem um trailler de sanduíches e atende pelo apelido de “Beppe”. Não possui telefone, conta em banco nem cartão de crédito. Só paga em dinheiro e olha atentamente antes de tocar um produto no supermercado: tem medo de deixar suas impressões digitais ou gotas de suor, que podem fornecer seu DNA. Compra todos os produtos que toca. Trabalha de luvas. Sempre.

O engenheiro eletrônico norte-americano Mitch Altman inventou um objeto interessante que ele batizou de “TV-B-Gone”. Na realidade é um controle-remoto capaz de desligar todos os televisores nas proximidades em, no máximo, sessenta e nove segundos. Altman afirma que “uma televisão ligada em local público é como o fumo passivo”. A engenhoca é pequena como um chaveiro e possui um único botão. Segundo o inventor, ninguém – até o momento – teria se lamentado das tvs desligadas. Por quinze dólares o brinquedinho pode ser adquirido pela internet. Descubram como e me mandem um de presente. Esse é fácil de usar.

Não bastasse a tecnologia invadir e facilitar nossas vidas, privando-nos de descobertas e curiosidades simples, transformando-nos em seres capazes de desenvolver obesidade mental, agora a tecnologia revolta-se contra ela mesma. A guerra entre robôs começou antes mesmo daquela entre máquinas e homens. Por via das dúvidas, vou desencaixotar minha Lettera 22.

Ciao.

6 comments:

Anonymous said...

Realmente. Estamos prestes a ter uma guerra robótica, de máquinas versus máquinas, e nós, mortais humanos, no meio de tudo, apenas fazendo a manutenção... Saudades da minha Olivetti. Saudade do passado. Saudades de mim! Abs sanguinários.

Anonymous said...

Caro Milton: Que texto bom!Antes de comentar, estou esperando o" aceito" no Multiply.
Bem, Eisten dizia que a 4a guerra mundial seria de pedra e pau. Mantenho a minha máquina de escrever guardada. Não sei se ainda há fitas!Talvez tenha de cortar a fita de uma matricial. Mas, ainda há o lápis.
Temos o direito a usufruir dos conhecimentos que nossa espécie constrói, mas, há 3 anos, chorei com os três controles remotos na mão, sem saber ligar e desligar o aparelho de TV, me senti uma idiota. Lembro de um comercial de video cassette que era a minha cara, pois oferecia uma professora de inglês junto. O inglês não era meu problema, já que morei lá em cima, a primeira lição da professora é que era importante: choose one finger..
Os chips sob a pele , que eu saiba, são os que S.João previu no apocalipse no tal 666. Está lá: ninguém poderá comprar ou vender se não tiver o 666 na testa ou na mão. Brrrr... MEDO!
Em breve, serei uma Thoureau revisitada, aí , nem mais blog, nem nada! Vou plantar e colher com a mão a pimenta e o sal!

Anonymous said...

Allan, risos..
Torna nel blog che tiene cosa nuova.
meire
http://pensamentosepoesias.blog.tiscali.it

Claudio Costa said...

Rapaz, essa avalanche tecnológica realmente é assustadora: As torneiras se abrem e se fecham, antes que possamos retirar o sabão! "Gadgets" estão por toda parte. Tenho um celular que pode tudo, mas eu só sei chamar e atender! No prédio onde trabalho, nem tirar meleca do nariz eu posso, dentro do elevador, pois ali está the big eye of the big brother...

Leila Silva said...

Allan,
Muito pertinente essas relfexoes...A internet foi uma das coisas que mais apreciei e aproveitei nestes ultimos tempos. Quanto aos botoes, eu tambem sou como voce. Ate gostaria de ser um pouco mais habilidosa com eles mas me irritam e deixo pra la.
Ciao!

Nora Borges said...

Nem para os manuais do uso dos controles remotos eu tenho paciência... é um vocabulário que não decifro.
Meu aparelho de som é um idiota... tem tudo para ser maravilhsoso, mas nao se comunica comigo lá muito bem...
E os chips... Deus me livre!
Adorei o comentário do Cláudio que nem meleca pode tirar em paz! hahahahah
Lembrei quando descobri uma câmara na garagem do meu prédio, justamente quando eu estava cedendo à tentação de brincar... ui!