Era o ano de 1959.
Turi percebeu que algo passava
entre ele e o Sol, mas não abriu o olho. Não sentia cheiro de comida, e isso
descartava a necessidade de se levantar da rede. Ninguém o importunaria, podia
voltar ao que mais gostava de fazer: nada. Sentir a brisa do mar era mais que
suficiente para um nobre como ele.
Minutos depois, o que quer que fosse
voltou a esconder o Sol. Turi se espreguiçou, coçou calmamente a
barriga, levantou a cabeça e só então abriu os olhos. Sobre o mar calmo, um
silensioso objeto circular fazia manobras aéreas. Às vezes quase tocando a
água, noutras, numa altura que não se podia enxergar. Curioso mas não
assustado, Turi apenas observava, pensar não era um hábito. Finalmente o objeto
parou acima da areia da praia, a uns dez metros de distância de Turi e esticou
um cilindro de uns três metros até o chão. De lá saíram três seres que pareciam
camarões (não na cor, mas na forma), que se dirigiram ao sorridente Turi.
▬
Olá! Viemos em paz. Gostaríamos de fazer uma proposta ao seu povo…
▬
Que proposta? – interrompeu Turi, enquanto se ajeitava na rede.
▬
Bem, gostaríamos de propor uma troca. Mas antes, deixe-nos explicar o que temos
a oferecer.
Turi olhou atentamente aqueles três
camarões imensos e não conteve o sorrisinho.
▬
Do quê você está rindo? – perguntou o camarão chefe.
▬
Desculpem, foi involuntário. É que eu… Bem, er… Aprecio camarões.
Instintivamente os três bichões deram um
passo para trás.
▬
Continuando – prosseguiu o suculento e enorme camarão chefe – nós viemos de uma
galáxia muito distante. Exploramos o Universo em busca de planetas como o seu para
incubar as nossas futuras gerações.
▬
Não tem motel por lá? …Ou praia? Na praia, se não estiver ventando, também dá
para produzir novas gerações.
▬
Não, o problema é a temperatura. Com o tempo, o nosso planeta está se
aquecendo, o que interfere na incubação dos ovos, matando-os antes da eclosão.
O subsolo de vocês tem a temperatura ideal e vai continuar assim por mais uns
cinco milhões de anos.
Turi ouvia com atenção. Salivando.
▬
Hum…
▬
Bom, a nossa civilização é muito evoluída, resolvemos todos aqueles problemas
que para vocês ainda parecem insolúveis, preservamos a natureza do Universo,
vivemos em paz com outros povos, aumentamos a qualidade de vida e atingimos uma
longevidade de cinco mil anos...
▬
Hum…
▬
Sim, imagino que você gostaria de saber qual é a nossa proposta, não?
▬
Hum… – coçava a barriga.
▬
Bom, assim como fizemos com outros planetas, gostaríamos de instalar
algumas colônias aqui. Tudo muito discreto, seu povo não vai nem ver.
▬
Hum…
▬
Não, não se preocupe, sabemos ser invisíveis. Pode acontecer algum incidente,
mas nada que prove a nossa presença no seu planeta. Em troca, oferecemos um dos
nossos planetas onde reproduzimos o seu habitat. Quer dizer, o habitat dessa
parte do planeta onde você e o seu povo vivem.
▬
Hum…
▬
Pode confiar. Estudamos a composição dessa região e já a reproduzimos em todos
os detalhes. Não falta nem mesmo o ar característico daqui. Só não adicionamos
nada de tecnológico, como avião ou telefones, pois entendemos que você prefere
não se envolver com essas besteiras.
▬
E como foi que me escolheram?
▬
Milhões de anos de experiência nos ensinaram que o povo que vive melhor é
aquele comanda o planeta. Sabemos que a qualidade de vida de vocês é invejada
pelos outros povos do seu planeta, que a música é a melhor, que deixam o
trabalho duro para os outros, que estão longe dos conflitos de poder
subalterno, que se alimentam basicamente do que o habitat de vocês oferece. E
dentre o seu povo, descobrimos que você é o ser mais relaxado. Portanto, você é
o monarca.
▬
Hum…
▬
Claro que não vamos levar todos de uma vez, isso provocaria alarme no resto da população e chamaria a atenção. O modo como agimos funciona do seguinte
modo: nós monitoramos cada pessoa; quando alguém estiver para
morrer, levamos para o novo planeta e, no caminho, curamos a pessoa e a
deixamos na nova casa pronta para os próximos cinco mil anos. Tudo o que pedimos
em troca é a possibilidade de incubar nossos filhos no subsolo do seu planeta.
Uma incubação que dura de vinte a vinte e dois anos, pelo tempo de vocês. Não
vamos interferir em nada, a menos que alguém descubra uma das nossas colônias. Nesse
caso – e somente nesse caso – a pessoa ou pessoas envolvidas serão eliminadas.
Turi estalou a boca, limpou a saliva com
as costas da mão, sentou-se na rede, se espreguiçou novamente e falou (com uma
fome dos diabos):
▬
Tá bom.
Estamos em 2018. O pacto funciona
perfeitamente até hoje.
Enquanto as colônias dos camarões gigantes são
cultivadas há anos, na Terra, em algum lugar no Universo, o preguiçoso filho de
pescador Turi e boa parte do seu povo vivem tranquilamente num planeta
exatamente igual à Samoa, onde os grandes camarões, por precaução, jamais
colocaram os pés.
ah ah muito bom. Pensei logo nos filmes dos Homens de preto.
ResponderExcluirabraço, garoto
Great post, thanks for sharing it.
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