sábado, julho 30, 2016

Vai acabar em pizza



O título deste post é uma expressão tipicamente brasileira, quando desejamos afirmar que algo não vai dar em nada. Pela quantidade de políticos, ex-políticos, gente graúda e empresários presos ou respondendo à justiça nos últimos anos, tenho a impressão de que as pizzarias brasileiras já não têm tantos clientes assim.

O escritor Gore Vidal, quando vendeu sua casa na Toscana – em 2008, se não me engano – deu uma entrevista ao jornalista Fabio Fazio. Quando Fazio perguntou o que mais o teria marcado do povo italiano, Vidal respondeu: “vou parafrasear De Gaulle: ‘governar um povo tão individualista assim,  não é impossível, mas inútil” [Na verdade a frase foi atribuída a diversos personagens].

A Itália é assim, muito em sintonia com o velho slogan militar brasileiro: ame-a ou deixe-a. Aliás, para quem deseja conhecer bem a cultura italiana, deixo alguns aforismos famosos sobre os costumes italianos. Use-os com ironia.

L’italiano non s’organizza: s’arrangia.
O italiano não se organiza, dá um jeito.
(Roberto Gervaso – jornalista e escritor)

Gli Italiani perdono le guerre come se fossero partite di calcio e le partite di calcio come se fossero guerre.
Os italianos perdem as guerras como se fossem partidas de futebol e partidas de futebol como se fossem guerras.
(Winston Churchill)

Tra gli italiani la solidarietà non esiste. Esiste la complicità.
Entre italianos não existe a solidariedade. Existe a cumplicidade.
(Indro Montanelli – jornalista e escritor)

Ho capito vivendo a Londra, che due inglesi fanno un popolo, ma 57 milioni di italiani no.
Vivendo em Londres, aprendi que dois ingleses formam um povo, mas que 57 milhões de italianos, não.
(Claudio Ranieri – treinador de futebol)

L’unica trasgressione possibile nel nostro paese è l’obbedienza alle regole.
A única transgressão possível no nosso país é a obediência às regras.
(Pino Caruso – ator e escritor)

È ora che gli italiani scendano in piazza a protestare contro se stessi.
Está na hora dos italianos saírem às ruas para protestar contra si próprios.
(Aldo Busi – escritor)

Se c’è una cosa che in Italia funziona è il disordine.
Se tem uma coisa que funciona na Itália, é a desordem.
(Leo Longanesi – jornalista, pintor e editor)

Gli italiani hanno solo due cose per la testa: l’altra sono gli spaghetti.
Os italianos só têm duas coisas na cabeça. A outra é o macarrão.
(Catherine Deneuve)

Un italiano è un latin lover, due italiani sono un casino, tre italiani fanno quattro partiti.
Um italiano é um latin lover, dois italianos são uma confusão, três italianos criam quatro partidos.
(Beppe Grillo – cômico e político)

L’italiano rispetta la legge soprattutto se coincide con i suoi interessi.
O italiano respeita a lei sobretudo se coincide com os seus interesses.
(Roberto Gervaso – jornalista e escritor)

All’estero quando un politico è coinvolto in un reato sparisce lui, in Italia sparisce il reato o sparisce il processo; una volta spariva anche il magistrato.
No exterior quando um político se envolve em alguma maracutaia, ele desaparece; na Itália desaparece a maracutaia ou desaparece o processo; um tempo desaparecia também o juiz.
(Marco Travaglio – jornalista, escritor e diretor de jornal)

Da noi, non si è mai semplicemente qualcuno. Si è sempre figli, fratelli o nipoti di qualcun altro.
Por aqui não se é nunca simplesmente alguém. Se é sempre filho, irmão ou sobrinho de alguém.
(Antonio Caprarica – jornalista)

La situazione politica in Italia è grave ma non è seria.
A situação política italiana é grave mas não é séria.
(Ennio Flaiano – dramaturgo, escritor, jornalista, humorista)

E as pizzarias italianas vivem lotadas.
 .

terça-feira, julho 19, 2016

Passageiro Garcia - parte II





Ah, Garcia. Se você soubesse...


Da alegria que sinto ao passearmos juntos, mesmo precisando ajudar você a caminhar,

Que você fala e resmunga como humano,

Dessa responsabilidade cúmplice em cuidarmos um do outro,

Desse seu pelo branco que engana a todos, que se assustam ao saber-te idoso,

Como a sua reação destruidora quando saímos à noite e te deixamos sozinho, parece tão humana,

Da paz que me dá quando brincamos ou quando você pede carinho,

Que esse seu olhar profundo chega a ser constrangedor,

Da dificuldade em aceitar as suas limitações crescentes,

Como me divirto quando você me expulsa do sofá,

Que a dona da farmácia – onde compro os seus remédios – me deu vinho no Natal,

Que a Eloá é a sua tutora legal e não sua propriedade, como você acredita,

Do seu senso de humor superior ao de muitos humanos,

Que a nossa lata de lixo não precisa ser destruída... agora é tarde,

Do espaço que ocupa hoje nas nossas vidas,

Da saudade futura que já me dói.

...E tenho a impressão que sabe, sim.




domingo, julho 10, 2016

Receita de ragú branco – molho à bolonhesa branco



O molho à bolonhesa, na verdade, chama-se ragù. O tradicional molho das macarronadas do domingo brasileiro, sofre modificações nas diferentes regiões da Itália, podendo ser mais rico ou mais leve, cozinhar horas ou só quarenta minutos, levar todo tipo de carne – inclusive linguiça – ou apenas carne de vaca, e por aí vai. Arrisco a dizer que é menos consumido aqui que no Brasil. O ragú branco, então...

Acontece que a Bianca adquiriu alergia a tomate cru ou muito cozido – como no caso do ragú clássico – mas meio cozido, pode. A saída foi fazer um ragú branco, que não leva tomate.

Ingredientes:
Papparedlle (não tinha, usei spaghetti)
Cenoura
Salsão
Cebola
Carne moída mista (usei carne de vaca moída e de porco em pedacinhos)
Pancetta defumada (que – tímida – não saiu na foto) ou bacon
Brodo (não usei, conto mais adiante)
Vinho branco (bebi antes)
Água
Sal
Pimenta do reino
Azeite de oliva
Queijo ralado na hora
Óleo de girassol (não tem na receita original)
Louro (não tem na receita original)
Canela em pó (não tem na receita original)



Corte bem fininho um ou dois talos de salsão (sem as folhas), a cebola e a cenoura; ponha uma frigideira grande com um fio de óleo de girassol e refogue bem tudo junto; adicione um pouco d’água, as folhas de louro, o sal, a pancetta cortada fininha e a pimenta do reino.


Deixe reduzir por alguns minutos e reserve. Na mesma frigideira, ponha um pouco – pouco! – de óleo de girassol, deixe aquecer e coloque a carne moída e a carne de porco em cubinhos; frite bem e deixe secar.


Caso forme um pouco de água no fundo da frigideira, recolha com uma colher e ponha no soffritto preparado antes (sim, refogado em italiano é soffritto), temperando no lugar do brodo.


Quando a carne estiver bem frita, adicione o soffritto reservado, um pouco d’água, corrija o sal e deixe cozinhar por quarenta minutos em fogo baixo. Antes de servir, adicione um fio longo de azeite de oliva e uma pitada de três dedos de canela em pó.


Sirva com um punhado generoso de queijo ralado na hora.


E a Bianca ficou feliz (mas ela preferiria não ter adquirido a alergia e comer o famoso ragú do papi, que costuma cozinhar por três horas).

.